Quando fui convidado para prefaciar este livro achei que não fosse capaz e, aproveitando que estamos sozinhos, confesso ainda não me achar. No entanto, não quis fazer essa desfeita a um amigo tão querido, pois tenho acompanhado a caminhada de Diogo Santana, quem já me proporcionou leituras fascinantes.
Neste texto me sinto convidado a assumir meu próprio eu, a me reconhecer diante de mim e dos outros. A emocionante história de Biografia anônima me ensina a comover-me com a minha própria. No entanto a ausência de maniqueísmo me faz ver que não se trata da história de alguém em especial, mas do humano; esse ser complexo que povoa esta terra, que se confunde com deuses e demônios; que hora destrói, mas no instante seguinte cria. É um equívoco dissociar nossas ações de seus autores, intitular se espirituais ou demoníacas quando, no muito, são meramente humanas. Outro equívoco é condenar o humano ao fracasso, pois o próprio Deus não o condenou. Por isso nos deixou sua palavra – a fé palavra – que se revela fonte de esperança ao humano, que enfraqueceu a si mesmo.
Fé, ingrediente indispensável para a receita da vida. Pois como já disse o teólogo ter fé é saltar no escuro, mas o que ele esqueceu de nos dizer é que caminhamos o tempo todo no escuro e, nunca sabemos onde poremos o pé no próximo passo. A verdade é que só os corajosos, ou inconseqüentes, às vezes saltam. E se saltam é porque acreditam ou que há um chão para detê-los, ou que suportam a queda. Admiro os que saltam, pela fé ou pela loucura; porque em nada se diferem, pois foi o apóstolo quem disse que Deus usa a loucura a fim de confundir a sabedoria. Pobre sabedoria, soberba e cheia de si mesma, a mais louca de todas.
Perigosa é a cultura do saber e do cientificismo que forma cirurgiões que aprendem, desde cedo, a dissecar a vida. Assim, separamos o trabalho da família, a sexualidade do amor, a fé do cotidiano acreditando que esta fé pode ser muito útil nas celebrações de domingo, mas que nada tem haver com o dia-a-dia. No entanto, a cultura da dissecação contraria a palavra de Deus que nos ensina a atar a fé/palavra ao punho e à testa, para que esta não seja por nós esquecida.
Em protesto a cultura da dissecação este texto propõe uma análise do humano a partir do próprio humano.
Não há outra maneira de falar de fé, moral, política, loucura, liberdade e amizade se não pela beleza da própria vida; do que se vive, do que se vê, do que se sente. E é com beleza que Diogo Santana nos propõe essa leitura; beleza esta que não se extrai das estruturas sociais, mas das relações humanas. Beleza que o humano recebe de seu criador.
Ao iniciar essa leitura me senti seqüestrado. Seqüestrado por mim mesmo. Pois Biografia anônima é a história de outro alguém, mas poderia muito bem ser a do próprio Diogo, ou a minha, ou a sua.
Jeferson André, Pastor adjunto da Igreja Batista da Redenção em Tomaz Coelho, Rio de Janeiro.