terça-feira, 27 de maio de 2008

Biografia Anônima

Estou de férias!
Tempo de cultivar novas e velhas virtudes, devotar-me às paixões mais sutis; um mês! único, para esquecer a transitória, porém maligna devoção dos meus contemporâneos ao altar da aparência, do dinheiro, da pompa!
O mundo vai passar....
Tempo de ler mais, enobrecer a alma que outrora declinava de cansaço, se tornado progressivamente banal. Restaurar a energia intelectual que formenta em mim inquietação, decidida, porém arriscada escolha de lançar-me no caminho solitário da dúvida e da crítica.
Preciso escrever mais, fundar um legado, morrer homem. Odeio tornar-me futil, imbecilizado diante da falsa exuberância e brilho do corpo da mulher, do prestígio, do nada... mas as vezes é inevitável, para alguns, vindo de uma pessoa como eu, futilidade é um pecado que não tem perdão.
Preciso retornar a familiar clausura no meu interior, deixar-me novamente me envolver pelo manto negro da melancolia onde todas as paisagens são cinzas. Amor? O que é o amor? Não há mulher que me compreenda. Sou demasiadamente idealista para subir a cabeça ao lirismo da poesia romântica. A solidão é uma boa companheira, entretanto, que as vezes reclama demais.
"Oh Deus, livrai-me do abismo,
de precipitar os pés em direção ao precipício."
Sinto-me feliz em respirar a atmosfera doce e entorpecente da burguesia: ao entrar numa livraria,me torno um refinado intelectual, observador sentado na torre, que olha de cima, na excitante agitação cultural dos cafés ou na mesa de bar junto com o povo, deixando o tempo passar lentamente; bem alto, sentado no topo do mundo, onde catedrais se confundem com o monopólio econômico de grandes empresas, elevado entre a multidão pedinte e desclaça, carente de pão, onde até mesmo os anciãos se sentem orfãos de seus pais, cercado de homens consumidores da carne de crianças famintas e sedentos pelo sangue de homens honestos, risonhos, gordos, felizes, necrofílicos. Poderia chamar isso de felicidade ou apenas uma hipócrita indiferença aos rumos tomados pela humanidade e sua mal sucedida representação de benevolência?
Somos todos atores, quanta mentira somos capazes de produzir!
Os séculos que outrora estavam atrás de nós, hoje passam por cima de nossas cabeças, são eles que irão nos julgar. O martelo já definiu a sua sentença: somos todos miseravelmente culpados, e eu também estou entre aqueles que estão destinados à fogueira, o que me resta saber é que parte de mim poderá sobreviver ao fogo e as cinzas.

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