segunda-feira, 1 de março de 2010

Quem você está seguindo?

É impressionante!

O início da igreja é marcado por um vigor extraordinário, de amor inconseqüente a mensagem da cruz e a todo o legado de Jesus Cristo. De tão inconseqüente esse amor é desafiador, é contestador. Inúmeras são as prisões por insubmissão à idolatria romana, os martírios, as fugas por causa da perseguição. Entretanto, em paralelo estão os grandes sermãos dos apóstolos, cheios de entusiasmo, as campanhas missionárias, o crescimento explosivo da fé em menos de cinqüenta anos, a vida comunitária dos primeiros cristãos, pois todos os que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e fazendas, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister (At. 2.44-45). Olhando para o passado, o presente parece apenas uma caricatura daquilo que foi o cristianismo em sua forma primitiva. De fato, tal evidência é um tanto incômoda e perturbadora – Somos de fato cristãos? Nossas ações testificam isso? Como entender tanta ousadia por parte da igreja primitiva? Se considerarmos tal ousadia como um fenômeno do Espírito Santo, arriscaria uma nova pergunta: Nós não temos do mesmo Espírito? Se considerarmos tal ousadia como um fenômeno da fé arriscaria: Nós não temos fé? O que temos então? O que somos então?

De fato, não é apenas pela expressiva militância que a primeira geração de cristãos se destaca de todas as gerações posteriores. A primeira geração de cristãos se destaca por terem sido a geração que testemunhou toda a vida, ensino, crucificação, morte e ressurreição de Jesus. Isso faz toda a diferença: ao ser crucificado Cristo é condenado pelo mundo, ao ressuscitar Cristo se torna o juiz do mundo e promete voltar para esse fim. A eminente volta de Jesus gera intensa expectativa, e diante dela, a conduta pessoal e comunitária se torna uma preocupação permanente. Como Tomé, a primeira geração de cristãos se distingue das demais por ser uma geração que creu apenas por que viu. O tempo passa e os martírios e a velhice começam a dar fim à primeira geração cristã. Deixam uma herança na fé: semeiam a geração porvir.

Entre os últimos da primeira geração estão Tiago e João. Apóstolos que inauguram a nova geração cristã. Uma geração que creu no que não viu: ... bem aventurados os que não viram e creram (Jo. 20.29). A segunda geração de cristãos é marcada precisamente por consolidar o cristianismo, motivados pelo ardor explosivo e exemplo da primeira geração, particularmente, os apóstolos. Com o progressivo martírio dos apóstolos, esse ardor diminui: surgem os problemas de imoralidade comunitária e pessoal, inúmeras disputas por poder e a criação de concessões para a diminuição de perseguições. O apóstolo João, como um dos últimos dos apóstolos se preocupa como o futuro das próximas gerações cristãs. Preocupação maior tem Jesus Cristo. Surge o apocalipse, especificadamente as cartas às sete igrejas, dentre elas, Pérgamo.

Pérgamo era uma cidade profundamente devotada à riqueza, a moda e ao misticismo. Onde foi inventado o pergaminho, recebendo seu nome justamente por causa dessa fonte de riqueza econômica. Possuía uma grande biblioteca que rivalizava com a de Alexandria em quantidade de livros. Era uma cidade profundamente mística e idólatra, por onde se desenvolveram cultos às mais variadas formas de divindades, como Zeus, Asclépio e Dionísio. Em 70 a.C. foi erigido um altar para a adoração de Augusto, imperador romano, tornando-se por conta disso o centro do culto ao imperador. Inevitavelmente o poder da igreja rivaliza com o as forças do inimigo. João, usando de uma metáfora, compara o trono do imperador Augusto como o trono do próprio diabo, por razões óbvias: por meio de um decreto, sob a penalidade de morte, ordenou que todo súdito do império romano deveria dirigir-lhe como “deus e senhor”, títulos que os cristãos atribuem unicamente a Jesus Cristo. Surge então um embate. Diante de tal conflito entre o império e a igreja, esta última tem o seu caráter provado: uns preferem a fé a própria vida, enquanto outros, preferem a vida a fé, e se submetem aos interesses dos poderes que dominam. A perseguição então se revela como um meio por onde os corações são provados e suas intenções reveladas.

Há os que seguem a Cristo (vv.13 e 17): e por isso estão prontos a morrer por ele, sem se preocupar com as conseqüências dessa decisão. É o caso de Antipas, possivelmente um grande líder mártir da igreja em Pérgamo. Simeão Metafrastes, contava a história lendária acerca de um certo Antipas, bispo de pérgamo, o qual nos tempos do imperador Domiciano foi fechado dentro de um boi de bronze, aquecido ao rubro. Seu corpo foi literalmente cozido. Diz-se que ele terminou seus últimos momentos em louvor e adoração. Exemplo entre as testemunhas de Jesus que retém o seu nome e não negam a fé.

Porque todo aquele que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé (1ª Jo. 5.4).

A fé vence o mundo! Quanto mais a força de um império! Entretanto, é preciso resistência. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: Ao vencedor, dar-lhe-ei do maná escondido, bem como lhe darei uma pedrinha branca, e sobre esta pedrinha escrito um nome novo, o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe (vv. 17). Pérgamo também se ocupava economicamente da mineração e comercialização de pedras brancas, utilizada para diversas finalidades: eram dadas aos que sofreram processos judiciais e foram absolvidos – prova de inocência. Era dada ao escravo liberto e que se tornara cidadão da província – prova de sua cidadania: Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador. O Senhor Jesus Cristo, o qual transformará o nosso corpo de humilhação, para ser igual ao da sua glória, segundo a eficácia do poder que ele tem de até subordinar a si todas as coisas (Fl. 3.20-21). Era também conferido aos vencedores das corridas ou lutas – prova de vitória: Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que vos amou (Rm.8.37). Era conferida ao guerreiro quando voltava da batalha – prova de coragem.

Há os que seguem a doutrina de Balaão e dos Nicolaítas: O termo nicolaíta tem um sentido ambíguo: é formado pelas palavras gregas nikh ( que significa domínio ) e laos/ laikos ( que significa leigo, gente, multidão, povo ). Literalmente “Os que exercem domínio sobre o povo”. Faziam parte de uma seita gnóstica que pregava a supremacia dos que administravam o culto (liturgia, palavra e etc..) das demais pessoas. No que se refere a moral, pregavam que o corpo é amoral no que se refere à espiritualidade, sendo assim, indiferente a salvação e santificação, sendo por isso, toleráveis quanto à promiscuidade. Daí alguns exegetas traduzirem nikh também por “destruir”. Nicolaítas também poderia ser traduzido como “Os que destoem o povo”, tal como Balaão.

Quem você está seguindo?: Onde os seus passos o estão levando em sua carreira cristã?
Nossas igrejas hoje, são marcadas pela fantasia de que números definem espiritualidade. Dentro das comunidades cristãs o altar se tornou um bem de consumo, e por isso, uma fonte de status e popularidade. Consequentemente, motivo para inúmeras disputas por poder. Desse modo, o altar se tornou o indicador de um enganoso tipo de santidade que faz do sagrado momento de culto apenas um espetáculo bem encenado, apenas uma forma de entretenimento: se esquece a quem se cultua, isso porque não se sabe por que se cultua. Soren Kierkegaard, teólogo e filósofo dinamarquês do séc. XIX, afirmou que a cristandade (a instituição cristã) aboliu o cristianismo em nome de Cristo. Seguir a Cristo é ser recíproco ao seu sacrifício na cruz: Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos (1ª Jo. 3.16).

Conclusão

Ser cristão consiste precisamente em seguir os mesmos passos que Jesus e prosseguir em seu caminho. É dar continuidade ao seu legado através da história e na eternidade. É escrever a história de Deus entre os homens. É implantar o seu reino nos corações. Isso não pode acontecer sem que haja tensões. Deus e o diabo brigam pelo mesmo espaço: o corações dos homens. Tropeções, quedas, momentos de desânimo e tristeza são naturais em toda a caminhada. A fidelidade a Deus responde em todos esses momentos. É exatamente esse o significado da palavra fé (fides em latim, que significa fidelidade). Ser fiel é uma condição para todas as instâncias, tal como num casamento quando os noivos prometem um ao outro: na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença, na alegria ou na dor e etc. Cristo louva aqueles que em face das dificuldades e perseguições não negam o seu nome, da mesma maneira que repreende e exorta ao arrependimento aqueles que em face de terem suas vidas ameaçadas pela perseguição, trocam a fé pela própria vida. A fé cristã é uma fé de mártires, logo, de pessoas decididas a amarem mais a Deus do que a si mesmas.

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