Se eu pregar o medo, levarei às pessoas o fardo pesado da imagem de um Deus rancoroso e irado, e temerosos por sua presença furiosa, não hesitarão em fazer todo o possível – até que se exumam as últimas gotas de sangue e suor; até incharem os joelhos e o corpo prostrado não ter mais força para se erguer do chão, para que enfim a ira da divindade se aplaque. Imagem de um Deus pagão, de prazos esgotados, onde apenas resta o esforço para que de maneira improvisada se ajustem à sua vontade.
Se eu pregar a esperança, levarei às pessoas ânimo suficiente para que esperem o tempo oportuno para a salvação de um Deus bondoso, contudo, que ensina pelo sofrimento, torne o homem maduro o suficiente para que enfrente a vida com a destreza de um equilibrista na corda bamba. Eu lhes darei esperança para que suportem mudos todo o sofrimento do mundo, e quem sabe, até mesmo os inspirarei a enfrentar até a morte! Quietos e tímidos, se tornarão homens sem nome, perdidos numa multidão apática e sonolenta, que assiste o sermão dominical matutino e terminado o culto tudo retorne como sempre foi. A força moral de um único homem que insiste em ser livre, é maior do que uma multidão de escravos silenciosos. Convenhamos: um Deus que encobre os nossos erros por pura gratuidade, e sem participação da nossa vontade, não necessita de veneração. É como se ele não existisse. Ele se nega a provar a sua existência no mundo, mas apenas fora dele.
O que irei pregar?
Quero pregar sobre um Deus justo, e que por tanto, se ira, mas também ama. E por isso ele é parecido conosco. Melhor dizendo: que nós somos parecidos com ele. Que é humano. Deus é humano, a medida em que é nosso criador. Criador do humano, ele é o primeiro deles. Sendo humano ele pode se tornar homem, Jesus.
segunda-feira, 15 de março de 2010
Afinal, Quem gosta da EBD?
A igreja se reune em assembléia. Após a ministração de um louvor congregacional, o pastor Fábio, partindo de uma breve reflexão bíblica inicia a assembléia administrativa. Entre a leitura da ata anterior, relatórios de departamentos e o relatório finaceiro, está em pauta entre os assuntos eventuais a proposta de mudança de horário da escola bíblica dominical, feita pelo seu atual diretor, o ir. Carlos.
- Meus irmãos - Inicia o pastor - Chegou a nós a proposta de mudarmos o horário da EBD, de 9:00 para as 8:00, a fim de que nossos estudos da palavra de Deus tenham um maior rendimento.
O irmão carlos pede a palavra:
- Acredito que uma hora de estudos seja insuficiente para o aprofundamento das questões levantadas no estudo da bíblia. Acredito que uma hora a mais seria rasoável.
O diácono Luís também pede a palavra:
- Acredito que grande parte da igreja não estaria disposta a tal empenho. A maioria nem mesmo sequer consegue chegar pontualmente, quanto mais se iniciarmos a EBD às 8:00.
Uma voz anônima sobressalta da congregação:
- É só diminuir o tempo do sermão...!
- Quem disse isso?! Perguntou o pastor Fábio, moderadamente enraivecido.
- Se os irmãos estudassem suas bíblias em casa, os professores não gastariam tanto tempo com a exposição do tema da semana para só depois iniciar as discussões. Desabafa o pastor Fábio.
- O grande problema é que muitos professores nem mesmo se preocupamem formar um bom projeto, dinâmico e atrativo para suas aulas. Afirma o diretor da EBD, ir. Carlos.
- Acredito que o problema seja com a direção da EBD, que não estimula os professoes. Afirma o diácono Luís.
- Estamos trabalhando para isso. Retruca o ir. Carlos.
- Mas onde estãos os resultados? Desafia o diácono.
O pastor interrompe...
- Acalmem-se meus irmãos, votaremos: que os favoráveis à mudança de horário da EBD erguessem uma das mãos por favor...
Nenhuma mão se extende.
O pastor continua...
- Então, que os favoráveis à permanência do atual horário da EBD erguessem uma de suas mãos...
Igualmente, nenhuma mãos se extende.
Conclui insatisfeito o pastor:
- vamos deixar em aberto esse assunto, e na quarta feira encerramos essa questão.
Depois desse dia, ninguém mais falou no assunto.
- Meus irmãos - Inicia o pastor - Chegou a nós a proposta de mudarmos o horário da EBD, de 9:00 para as 8:00, a fim de que nossos estudos da palavra de Deus tenham um maior rendimento.
O irmão carlos pede a palavra:
- Acredito que uma hora de estudos seja insuficiente para o aprofundamento das questões levantadas no estudo da bíblia. Acredito que uma hora a mais seria rasoável.
O diácono Luís também pede a palavra:
- Acredito que grande parte da igreja não estaria disposta a tal empenho. A maioria nem mesmo sequer consegue chegar pontualmente, quanto mais se iniciarmos a EBD às 8:00.
Uma voz anônima sobressalta da congregação:
- É só diminuir o tempo do sermão...!
- Quem disse isso?! Perguntou o pastor Fábio, moderadamente enraivecido.
- Se os irmãos estudassem suas bíblias em casa, os professores não gastariam tanto tempo com a exposição do tema da semana para só depois iniciar as discussões. Desabafa o pastor Fábio.
- O grande problema é que muitos professores nem mesmo se preocupamem formar um bom projeto, dinâmico e atrativo para suas aulas. Afirma o diretor da EBD, ir. Carlos.
- Acredito que o problema seja com a direção da EBD, que não estimula os professoes. Afirma o diácono Luís.
- Estamos trabalhando para isso. Retruca o ir. Carlos.
- Mas onde estãos os resultados? Desafia o diácono.
O pastor interrompe...
- Acalmem-se meus irmãos, votaremos: que os favoráveis à mudança de horário da EBD erguessem uma das mãos por favor...
Nenhuma mão se extende.
O pastor continua...
- Então, que os favoráveis à permanência do atual horário da EBD erguessem uma de suas mãos...
Igualmente, nenhuma mãos se extende.
Conclui insatisfeito o pastor:
- vamos deixar em aberto esse assunto, e na quarta feira encerramos essa questão.
Depois desse dia, ninguém mais falou no assunto.
segunda-feira, 1 de março de 2010
O Coração do Artista
De maneira evidente, a cultura evangélica jamais experimentou antes, tal como nos últimos anos, uma acentuada preocupação com a adoração comunitária: o número de ministérios de louvor, bandas e cantores solo aumentam exponencialmente. Centenas de livros, palestras e Workshops. O número de ministros (pregadores), especialistas no assunto também. Números não podem definir qualidades. A quantidade de pessoas interessadas em adoração não define precisamente o comprometimento em adorar. Dentro das comunidades cristãs o altar se tornou um bem de consumo, e por isso, uma fonte de status e popularidade – definição contemporânea de espiritualidade. Consequentemente, motivo para inúmeras disputas por poder. Desse modo, o altar se tornou o indicador de um enganoso tipo de espiritualidade que faz do sagrado momento de culto apenas um espetáculo bem encenado, apenas uma forma de entretenimento: se esquece a quem se cultua, isso porque não se sabe por que se cultua.
Quem é o artista? Como distingui-lo da multidão?
É sensato afirmar que Deus ao criar, expressa em toda a sua obra parte da sua identidade, personalidade, senso estético e porque não dizer, seu bom humor. Deus é artista! É só olhar a praia num dia ensolarado: o mar azul, agitado, as ondas batendo nas encostas das rochas... Beleza que impressiona os olhos. É só olhar o céu numa noite de verão: estrelas que mais parecem pequenas faíscas de luz, vaga-lumes imóveis no céu, acompanhada pela lua redonda e luminosa. Beleza que emociona. Tal como o nascimento de uma criança.
Deus ao criar o homem também lhe concede a oportunidade de ser criador. É correto afirmar que todos os homens sem exceção possuem a capacidade de criar: uma tela, uma música, uma escultura, um livro. Não podemos distinguir a história das civilizações de tudo aquilo que elas produziram como arte, seja para entretenimento, sobrevivência, guerra ou fé... Arte é toda forma de beleza que congrega pessoas, que gera espanto, admiração. Entretanto, o artista se distingue por não se restringir em apenas criar. Sua força criadora é obsessiva, é feita com paixão. O artista tem paixão por criar. É exatamente por isso que com freqüência cria por impulsão e compulsão.
Enquanto criador compulsivo, todo artista tende a exercer certo tipo de exigência sobre sua capacidade em produzir, neste aspecto, alguns podem tender para o perfeccionismo. Outros, porém, exercem certo tipo de exigência sobre a receptividade coletiva sobre tudo aquilo que produzem. Neste aspecto, alguns podem adquirir alguns problemas com o ego. Seja tanto por uma exagerada alta estima, como também por uma estima baixa. Em síntese, é comum a natureza artista certa instabilidade com o meio: o que define tal instabilidade é exatamente sua crença natural de que sempre há um problema, seja naquilo que produz (nesse caso tende a considerar que o problema é ele mesmo), seja no modo como as pessoas recebem sua obra (nesse caso tende a considerar o problema como sedo o próprio público). Como conseqüência, todo artista é marcado, a sua maneira por uma forte personalidade melancólica. Aristóteles dizia que “todos os homens extraordinários, de destaque na filosofia, na política, na poesia e nas artes são evidentemente melancólicos” (pág.12).
Somos na maioria das vezes vistos como demasiadamente analíticos, mal-humorados, insociáveis, e super sensíveis. O que mais me incomoda é que se você é rotulado como melancólico, automaticamente pressupõe-se que seja um sujeito emocionalmente desajustado (pág.14)
Rory Noland em O Coração do Artista tem uma outra interpretação para essa forte personalidade melancólica: ela apenas determina :
... que pessoas sensíveis tem muito coração (...). Por esse motivo, os artistas frequentemente pronunciam-se contra a injustiça, as desigualdades e a hipocrisia. Eles abraçam a causa dos que estão sofrendo. Eles nos fazem mais sensíveis para com os perdidos e solitários e à condição dos oprimidos (pág.14).
O artista é um agente de ruptura, logo, de transformação. O mesmo ideal transformador tem o evangelho! É nesse aspecto que a arte pode se pactuar com os ideais da fé: para transformar vidas:
É por isso que a igreja precisa dos artistas. Nós precisamos de artistas na igreja que tenham paixão pelo poder das artes (...). Quando Deus unge as artes, há um poder tremendo liberado por Ele para penetrar nos corações, mentes e almas. Nós como povo de Deus não devemos perder de vista o quão poderosas as artes podem ser na igreja (pág.19).
A igreja precisa de artistas! E quando artistas se comprometem com o ideal transformador do evangelho, o culto se transforma numa obra de arte que glorifica a Deus, o maior dos artistas.
Há ocasiões quando um pregador fala às paredes. Pegue esta mesma mensagem e coloque nela uma linda melodia ou qualquer outra forma de arte, e ela toca as pessoas (pág.21-22).
Entretanto, o culto enquanto pura manifestação artista tende apenas ao banal espetáculo, ao oculto idólatra de personalidades egoístas e mesquinhas. A igreja necessita de artistas comprometidos com Cristo. Necessitamos de artistas na igreja que sejam conhecidos não apenas por seu talento, mas também por sua caminhada com Cristo (pág. 24). É nesse aspecto que a igreja ganha importância na vida do artista, a fim de construir nele, valores autenticamente cristãos e comprometidos com o Reino de Deus. Os artistas também precisam da igreja! Para o estabelecimento de um caráter comprometido com a fé em Jesus. O que significa fazer do caráter algo mais importante que prestígio e reputação. Preocupe-se mais com o seu caráter do que com a sua reputação, porque o seu caráter é o que você realmente é, enquanto que a sua reputação é meramente o que os outros acham que você é (pág.30).
Sempre quando nos referimos ao caráter do artista cristão, inevitavelmente estaremos lidando com o comum conflito entre o artista e o servo, sobre as reais motivações que nos levam a cultuar e sobre o nosso relacionamento com outros artistas cristãos e irmãos em Cristo. Inevitavelmente estamos falando de ética. De ética cristã.
Precisamos olhar para o íntimo do nosso coração e ficarmos com os olhos atentos em nossas motivações, porque a bíblia diz que o coração humano é “enganoso” e “desesperadamente corrupto”...(pág.39).
Quando artistas têm mais confiança em seus dons no que no Senhor, deixam o palco mais preocupados com a impressão que causaram ou o som que produziram do que se Deus os usou. Estão mais interessados na técnica que na substância (pág.40).
Rory defende que a base da ética cristã para o artista é a humildade. Ele diz: Serviço cristão começa com humildade. Humildade significa mover-se do egoísmo para a doação a Deus (pág. 41).
....milhares de humanos tem sido levados a pensar que a humildade significa garotas bonitas tentando crer que são feias e homens inteligentes tentando crer que são tolos (Rory citando C.S.Lewis – pág.42).
Devemos julgar a nós mesmos com um julgamento correto. A verdadeira humildade significa termos uma visão acurada de nós mesmo, entendendo que não somos mais nem menos do que na verdade somos. Devemos conhecer nossos pontos fracos e fortes. Devemos saber no que somos bons e no que não somos (pág.42).
Devemos abandonar qualquer pensamento de superioridade que nos faça pensar que merecemos tratamento especial (pág.43).
Muitos relutam em ser servos quando têm que trabalhar na obscuridade (pág. 56).
Quem é o artista cristão?
Defini-lo é antes de tudo afirmar que arte é fé são compatíveis, que a verdade também expressa beleza, de que o divino é belo, e que por isso, diante da sua manifestação, congrega pessoas, que as motiva à admiração, à devoção. O artista cristão é resultado dessa compatibilidade entre arte e fé, entre beleza e verdade. A arte para ele se orienta nas profundezas da verdade do evangelho. Quando falamos de verdade sempre quando nos referimos aos evangelhos, falamos implicitamente de princípios. Para que o artista seja de fato cristão, e para que sua arte seja definida como tal, ele parte de princípios éticos bem definidos pelas escrituras, que nos foram legados por Jesus. O artista cristão possui ética, mas não uma ética qualquer, ele possui a mesma ética que Jesus.
A palavra ética define um conjunto de valores estabelecidos para uma boa convivência em comunidade. Definir o artista cristão é descrever como o artista que é cristão vive na comunidade onde vive (sociedade) e expressa sua arte (igreja). No capítulo um de O Coração do Artista, Roy Roland, irá afirmar que o artista cristão se define por um caráter (logo, um conjunto de valores) cristão. No segundo capítulo, irá afirmar que o primeiro desses valores é a humildade. No terceiro capítulo ele irá descrever como se estabelece a relação entre o artista e a comunidade, particularmente, a igreja. A manifestação da beleza divina congrega pessoas. Surge a igreja, sua missão e propósito de expandir a fé em Cristo. O artista cristão participa dessa missão quando sensibilizado diante da beleza do divino, é inspirado por ela a contagiar as pessoas com essa mesma fé.
Todo artista possui uma busca natural por autonomia, principalmente quando produz sua arte. Esse é um problema que o artista cristão terá que aprender a vencer em sua comunidade de fé. Ele terá que aprender a trabalhar em equipe.
(...). Parte do que fazemos como artistas, fazemos sozinhos (...). Fazer com que artistas que sejam basicamente introvertidos e independentes funcionem como um time, não é uma tarefa fácil (pág. 61).
Como um ser que procura independência, todo artista possui uma tendência natural a serem mais egoístas, murmuradores, competitivos e a não resolverem muitos de seus conflitos de relacionamento. O artista cristão, diferente do artista comum, fundamenta sua conduta na palavra de Deus, sendo assim, ele é conduzido por um conjunto de princípios éticos cristãos, que fazem da sua arte e da sua pessoa uma forma de comunhão, de convergência. Rory Noland sintetiza tais princípios éticos da seguinte maneira (dentre os quais cito alguns):
• O membro de equipe está comprometido com a causa de sua equipe:
No ministério estar comprometido com a causa de uma equipe significa que colocamos a missão da igreja sobre todas as coisas, acima de nossa própria agenda. De tempos em tempos ouço histórias de ministérios de artes nos quais os membros da equipe não estão sintonizados. O resultado é que músicos, membros de grupo de teatro, dançarinos, e etc., estão buscando seu próprio interesse em vez de se reunir para um bem comum (pág. 67).
• O membro de uma equipe está comprometido com a solução de conflitos de relacionamento:
Se cada membro da equipe assumir a responsabilidade pela unidade dela, a equipe irá “pensar a mesma coisa, ter o mesmo amor, e ser unidade alma, tendo o mesmo sentimento”(Fil. 2:2). (pág. 68).
A nossa unidade é frequentemente um testemunho mais poderoso que a nossa música (pág.69).
• O membro de uma equipe encoraja e apóia seus colegas:
Quando se trata de artes na igreja, precisamos cultivar um ambiente que seja encorajador, doador e colaborador. Isto é parte do que significa sustentar artistas, especialmente os artistas com quem servimos. Muitos de nós não têm dificuldade em encorajar alguém cujos dons não apresentem ameaça ao nosso ministério. Nosso caráter é verdadeiramente provado quando apoiamos àqueles que têm o mesmo dom que temos (pág.71).
• O membro de uma equipe não se apega ao seu dom:
Se seus talentos e habilidades são de Deus, a quem realmente eles pertencem? A Ele. Eles são emprestados a nós e temos que ser mordomos fiéis dele. Assim sendo, podemos abrir mão dos nossos dons e deposita-los aos pés de Jesus para que possam ser usados para edificar Sua Igreja conforme a sua vontade (págs.72-73).
O artista cristão sempre está na tensão entre o que se é (artista) e o que deve ser (cristão), como defende Roy, uma convergência é possível, entretanto, sem antes passar por conflitos que devem ser superados por todo artista que procura progredir em seu ministério, enquanto cristão. Os capítulos quatro e cinco irão tratar separadamente sobre dois desses conflitos: o perfeccionismo (confundido muitas vezes no ministério com uma suposta procura por excelência) e o modo como o artista cristão deve lidar com as críticas de seu trabalho ministerial.
O perfeccionismo é uma postura típica de muitos artistas, e significa uma certa insegurança quanto a qualidade de seu trabalho, logo também, de seu desenvolvimento quanto artista. Como Defende Roy, ele tem a tendência de maximizar o negativo e minimizar o positivo (pág.83):
O perfeccionista é culpado de pensar em preto branco. Algo é ou totalmente bom ou totalmente ruim(...). Perfeccionistas têm a tendência de serem muito críticos. E lidam muito duramente consigo mesmos quando falham. Como resultado, perfeccionistas acabam enveredando no hábito de falar mal de si mesmos ou negativamente (pág. 84).
Roy aponta como causa para o perfeccionismo uma auto-estima baseada na performance e não na identidade e a idealização de expectativas altas e impraticáveis. Entretanto, apresenta algumas maneiras de aprendermos a tratar nosso perfeccionismo: Não fazer da auto-estima um deus e estabelecer expectativas realistas para a vida. A excelência, por outro lado, simplesmente significa que o artista se apresenta ou cria com habilidade (pág.95) e envolve criatividade, originalidade e preparação espiritual.
Muitos artistas também são reconhecidos por terem uma postura defensiva:
Às vezes aqueles dentre nós com temperamentos artísticos tomam posturas defensivas quando criticados. Ficamos sensíveis além da conta, deixando que coisas muito pequenas nos firam (pág. 105).
O que começa como um mecanismo de defesa contra a dor acaba levando a um sofrimento ainda maior: solidão e alienação (...). Num esforço para proteger nossa auto-estima, nos abrimos para algo mais prejudicial do que um ego ferido, que é nos iludirmos sobre quem somos (págs. 106-107).
Toda a avaliação, mesmo que negativa, nos motiva ao crescimento. Entretanto, isso só acontece quando estamos dispostos a isso. Todo crítica nos sugere um caminho para mudança. É preciso ter discernimento, e isso somente pode acontecer num coração sensível a vontade de Deus.
Artistas normalmente possuem um aguçado senso de competitividade:
Você já invejou os talentos de um outro artista? Você já sentiu ciúme do sucesso de alguém? E você é um artista, precisa saber como lidar com ciúme e inveja, porque sempre haverá alguém mais talentoso, mais bem sucedido, mais em destaque, mais atraente ou mais proeminente no ministério que você (pág.123).
O ciúme e a inveja são formas de rivalidade oriundas da insegurança. Todo artista teme não ser talentoso o suficiente. O ciúme e a inveja são frutos do medo de ser deixado de lado pelos holofotes. São frutos do medo do anonimato e falta de reconhecimento. Diferente do artista comum, Deus chama o artista cristão para trabalhar em equipe, extinguindo por isso todo sentimento de rivalidade através do diálogo e profunda devoção a Deus.
Deus nos quer trabalhando juntos, e não um contra o outro. Em vez de competirmos uns contra os outros, podemos aprender muito uns com os outros. Podemos ser irmãos e irmãs ao invés de rivais (...). É um sinal de caráter quando não mais nos sentimos ameaçados pelos talentos e habilidades de outros. Isso é resultado de estarmos seguros sobre quem somos como indivíduos, como artistas únicos e individuais, e de confiarmos na obra de Deus em nossas vida (pág.133).
Como um ser predominantemente instável, todo artista tende a ser intensamente emotivo. Daí rompantes exagerados de fúria e felicidade, numa confusa mistura de sentimentos quando em grupo. Seriam as emoções amigas ou inimigas do artista cristão? Poderiam as mesmas lhe auxiliar ou prejudicar em sua vida cristã? Alegrias e tristezas são experiências naturais de todo ser humano. O artista cristão transforma essas experiências em adoração. Particularmente, em adoração comunitária. Com isso, é como se ele dissesse a Deus: “Seja na dor ou na alegria, somos de Cristo e estamos com ele sempre”.
Foster escreve: “nós podemos ter um sentimento de sequidão, solidão, mesmo perdição. Qualquer dependência extrema sobre a vida emocional é retirada. A noção frequentemente ouvida hoje de que tais experiências deveriam ser evitadas e que devemos viver em paz, conforto, alegria e celebração, apenas nega o fato de que muito da experiência contemporânea é conversa superficial. A noite escura é uma daquelas maneiras que Deus usa para levar-nos à quietude, ao repouso, a fim de que possamos produzir uma transformação interior em nossa alma (pág. 142).
É preciso saber controlar as emoções. Sua intensidade pode gerar circunstâncias que fogem do nosso controle, inclusive ao pecado.
Quem é o artista? Como distingui-lo da multidão?
É sensato afirmar que Deus ao criar, expressa em toda a sua obra parte da sua identidade, personalidade, senso estético e porque não dizer, seu bom humor. Deus é artista! É só olhar a praia num dia ensolarado: o mar azul, agitado, as ondas batendo nas encostas das rochas... Beleza que impressiona os olhos. É só olhar o céu numa noite de verão: estrelas que mais parecem pequenas faíscas de luz, vaga-lumes imóveis no céu, acompanhada pela lua redonda e luminosa. Beleza que emociona. Tal como o nascimento de uma criança.
Deus ao criar o homem também lhe concede a oportunidade de ser criador. É correto afirmar que todos os homens sem exceção possuem a capacidade de criar: uma tela, uma música, uma escultura, um livro. Não podemos distinguir a história das civilizações de tudo aquilo que elas produziram como arte, seja para entretenimento, sobrevivência, guerra ou fé... Arte é toda forma de beleza que congrega pessoas, que gera espanto, admiração. Entretanto, o artista se distingue por não se restringir em apenas criar. Sua força criadora é obsessiva, é feita com paixão. O artista tem paixão por criar. É exatamente por isso que com freqüência cria por impulsão e compulsão.
Enquanto criador compulsivo, todo artista tende a exercer certo tipo de exigência sobre sua capacidade em produzir, neste aspecto, alguns podem tender para o perfeccionismo. Outros, porém, exercem certo tipo de exigência sobre a receptividade coletiva sobre tudo aquilo que produzem. Neste aspecto, alguns podem adquirir alguns problemas com o ego. Seja tanto por uma exagerada alta estima, como também por uma estima baixa. Em síntese, é comum a natureza artista certa instabilidade com o meio: o que define tal instabilidade é exatamente sua crença natural de que sempre há um problema, seja naquilo que produz (nesse caso tende a considerar que o problema é ele mesmo), seja no modo como as pessoas recebem sua obra (nesse caso tende a considerar o problema como sedo o próprio público). Como conseqüência, todo artista é marcado, a sua maneira por uma forte personalidade melancólica. Aristóteles dizia que “todos os homens extraordinários, de destaque na filosofia, na política, na poesia e nas artes são evidentemente melancólicos” (pág.12).
Somos na maioria das vezes vistos como demasiadamente analíticos, mal-humorados, insociáveis, e super sensíveis. O que mais me incomoda é que se você é rotulado como melancólico, automaticamente pressupõe-se que seja um sujeito emocionalmente desajustado (pág.14)
Rory Noland em O Coração do Artista tem uma outra interpretação para essa forte personalidade melancólica: ela apenas determina :
... que pessoas sensíveis tem muito coração (...). Por esse motivo, os artistas frequentemente pronunciam-se contra a injustiça, as desigualdades e a hipocrisia. Eles abraçam a causa dos que estão sofrendo. Eles nos fazem mais sensíveis para com os perdidos e solitários e à condição dos oprimidos (pág.14).
O artista é um agente de ruptura, logo, de transformação. O mesmo ideal transformador tem o evangelho! É nesse aspecto que a arte pode se pactuar com os ideais da fé: para transformar vidas:
É por isso que a igreja precisa dos artistas. Nós precisamos de artistas na igreja que tenham paixão pelo poder das artes (...). Quando Deus unge as artes, há um poder tremendo liberado por Ele para penetrar nos corações, mentes e almas. Nós como povo de Deus não devemos perder de vista o quão poderosas as artes podem ser na igreja (pág.19).
A igreja precisa de artistas! E quando artistas se comprometem com o ideal transformador do evangelho, o culto se transforma numa obra de arte que glorifica a Deus, o maior dos artistas.
Há ocasiões quando um pregador fala às paredes. Pegue esta mesma mensagem e coloque nela uma linda melodia ou qualquer outra forma de arte, e ela toca as pessoas (pág.21-22).
Entretanto, o culto enquanto pura manifestação artista tende apenas ao banal espetáculo, ao oculto idólatra de personalidades egoístas e mesquinhas. A igreja necessita de artistas comprometidos com Cristo. Necessitamos de artistas na igreja que sejam conhecidos não apenas por seu talento, mas também por sua caminhada com Cristo (pág. 24). É nesse aspecto que a igreja ganha importância na vida do artista, a fim de construir nele, valores autenticamente cristãos e comprometidos com o Reino de Deus. Os artistas também precisam da igreja! Para o estabelecimento de um caráter comprometido com a fé em Jesus. O que significa fazer do caráter algo mais importante que prestígio e reputação. Preocupe-se mais com o seu caráter do que com a sua reputação, porque o seu caráter é o que você realmente é, enquanto que a sua reputação é meramente o que os outros acham que você é (pág.30).
Sempre quando nos referimos ao caráter do artista cristão, inevitavelmente estaremos lidando com o comum conflito entre o artista e o servo, sobre as reais motivações que nos levam a cultuar e sobre o nosso relacionamento com outros artistas cristãos e irmãos em Cristo. Inevitavelmente estamos falando de ética. De ética cristã.
Precisamos olhar para o íntimo do nosso coração e ficarmos com os olhos atentos em nossas motivações, porque a bíblia diz que o coração humano é “enganoso” e “desesperadamente corrupto”...(pág.39).
Quando artistas têm mais confiança em seus dons no que no Senhor, deixam o palco mais preocupados com a impressão que causaram ou o som que produziram do que se Deus os usou. Estão mais interessados na técnica que na substância (pág.40).
Rory defende que a base da ética cristã para o artista é a humildade. Ele diz: Serviço cristão começa com humildade. Humildade significa mover-se do egoísmo para a doação a Deus (pág. 41).
....milhares de humanos tem sido levados a pensar que a humildade significa garotas bonitas tentando crer que são feias e homens inteligentes tentando crer que são tolos (Rory citando C.S.Lewis – pág.42).
Devemos julgar a nós mesmos com um julgamento correto. A verdadeira humildade significa termos uma visão acurada de nós mesmo, entendendo que não somos mais nem menos do que na verdade somos. Devemos conhecer nossos pontos fracos e fortes. Devemos saber no que somos bons e no que não somos (pág.42).
Devemos abandonar qualquer pensamento de superioridade que nos faça pensar que merecemos tratamento especial (pág.43).
Muitos relutam em ser servos quando têm que trabalhar na obscuridade (pág. 56).
Quem é o artista cristão?
Defini-lo é antes de tudo afirmar que arte é fé são compatíveis, que a verdade também expressa beleza, de que o divino é belo, e que por isso, diante da sua manifestação, congrega pessoas, que as motiva à admiração, à devoção. O artista cristão é resultado dessa compatibilidade entre arte e fé, entre beleza e verdade. A arte para ele se orienta nas profundezas da verdade do evangelho. Quando falamos de verdade sempre quando nos referimos aos evangelhos, falamos implicitamente de princípios. Para que o artista seja de fato cristão, e para que sua arte seja definida como tal, ele parte de princípios éticos bem definidos pelas escrituras, que nos foram legados por Jesus. O artista cristão possui ética, mas não uma ética qualquer, ele possui a mesma ética que Jesus.
A palavra ética define um conjunto de valores estabelecidos para uma boa convivência em comunidade. Definir o artista cristão é descrever como o artista que é cristão vive na comunidade onde vive (sociedade) e expressa sua arte (igreja). No capítulo um de O Coração do Artista, Roy Roland, irá afirmar que o artista cristão se define por um caráter (logo, um conjunto de valores) cristão. No segundo capítulo, irá afirmar que o primeiro desses valores é a humildade. No terceiro capítulo ele irá descrever como se estabelece a relação entre o artista e a comunidade, particularmente, a igreja. A manifestação da beleza divina congrega pessoas. Surge a igreja, sua missão e propósito de expandir a fé em Cristo. O artista cristão participa dessa missão quando sensibilizado diante da beleza do divino, é inspirado por ela a contagiar as pessoas com essa mesma fé.
Todo artista possui uma busca natural por autonomia, principalmente quando produz sua arte. Esse é um problema que o artista cristão terá que aprender a vencer em sua comunidade de fé. Ele terá que aprender a trabalhar em equipe.
(...). Parte do que fazemos como artistas, fazemos sozinhos (...). Fazer com que artistas que sejam basicamente introvertidos e independentes funcionem como um time, não é uma tarefa fácil (pág. 61).
Como um ser que procura independência, todo artista possui uma tendência natural a serem mais egoístas, murmuradores, competitivos e a não resolverem muitos de seus conflitos de relacionamento. O artista cristão, diferente do artista comum, fundamenta sua conduta na palavra de Deus, sendo assim, ele é conduzido por um conjunto de princípios éticos cristãos, que fazem da sua arte e da sua pessoa uma forma de comunhão, de convergência. Rory Noland sintetiza tais princípios éticos da seguinte maneira (dentre os quais cito alguns):
• O membro de equipe está comprometido com a causa de sua equipe:
No ministério estar comprometido com a causa de uma equipe significa que colocamos a missão da igreja sobre todas as coisas, acima de nossa própria agenda. De tempos em tempos ouço histórias de ministérios de artes nos quais os membros da equipe não estão sintonizados. O resultado é que músicos, membros de grupo de teatro, dançarinos, e etc., estão buscando seu próprio interesse em vez de se reunir para um bem comum (pág. 67).
• O membro de uma equipe está comprometido com a solução de conflitos de relacionamento:
Se cada membro da equipe assumir a responsabilidade pela unidade dela, a equipe irá “pensar a mesma coisa, ter o mesmo amor, e ser unidade alma, tendo o mesmo sentimento”(Fil. 2:2). (pág. 68).
A nossa unidade é frequentemente um testemunho mais poderoso que a nossa música (pág.69).
• O membro de uma equipe encoraja e apóia seus colegas:
Quando se trata de artes na igreja, precisamos cultivar um ambiente que seja encorajador, doador e colaborador. Isto é parte do que significa sustentar artistas, especialmente os artistas com quem servimos. Muitos de nós não têm dificuldade em encorajar alguém cujos dons não apresentem ameaça ao nosso ministério. Nosso caráter é verdadeiramente provado quando apoiamos àqueles que têm o mesmo dom que temos (pág.71).
• O membro de uma equipe não se apega ao seu dom:
Se seus talentos e habilidades são de Deus, a quem realmente eles pertencem? A Ele. Eles são emprestados a nós e temos que ser mordomos fiéis dele. Assim sendo, podemos abrir mão dos nossos dons e deposita-los aos pés de Jesus para que possam ser usados para edificar Sua Igreja conforme a sua vontade (págs.72-73).
O artista cristão sempre está na tensão entre o que se é (artista) e o que deve ser (cristão), como defende Roy, uma convergência é possível, entretanto, sem antes passar por conflitos que devem ser superados por todo artista que procura progredir em seu ministério, enquanto cristão. Os capítulos quatro e cinco irão tratar separadamente sobre dois desses conflitos: o perfeccionismo (confundido muitas vezes no ministério com uma suposta procura por excelência) e o modo como o artista cristão deve lidar com as críticas de seu trabalho ministerial.
O perfeccionismo é uma postura típica de muitos artistas, e significa uma certa insegurança quanto a qualidade de seu trabalho, logo também, de seu desenvolvimento quanto artista. Como Defende Roy, ele tem a tendência de maximizar o negativo e minimizar o positivo (pág.83):
O perfeccionista é culpado de pensar em preto branco. Algo é ou totalmente bom ou totalmente ruim(...). Perfeccionistas têm a tendência de serem muito críticos. E lidam muito duramente consigo mesmos quando falham. Como resultado, perfeccionistas acabam enveredando no hábito de falar mal de si mesmos ou negativamente (pág. 84).
Roy aponta como causa para o perfeccionismo uma auto-estima baseada na performance e não na identidade e a idealização de expectativas altas e impraticáveis. Entretanto, apresenta algumas maneiras de aprendermos a tratar nosso perfeccionismo: Não fazer da auto-estima um deus e estabelecer expectativas realistas para a vida. A excelência, por outro lado, simplesmente significa que o artista se apresenta ou cria com habilidade (pág.95) e envolve criatividade, originalidade e preparação espiritual.
Muitos artistas também são reconhecidos por terem uma postura defensiva:
Às vezes aqueles dentre nós com temperamentos artísticos tomam posturas defensivas quando criticados. Ficamos sensíveis além da conta, deixando que coisas muito pequenas nos firam (pág. 105).
O que começa como um mecanismo de defesa contra a dor acaba levando a um sofrimento ainda maior: solidão e alienação (...). Num esforço para proteger nossa auto-estima, nos abrimos para algo mais prejudicial do que um ego ferido, que é nos iludirmos sobre quem somos (págs. 106-107).
Toda a avaliação, mesmo que negativa, nos motiva ao crescimento. Entretanto, isso só acontece quando estamos dispostos a isso. Todo crítica nos sugere um caminho para mudança. É preciso ter discernimento, e isso somente pode acontecer num coração sensível a vontade de Deus.
Artistas normalmente possuem um aguçado senso de competitividade:
Você já invejou os talentos de um outro artista? Você já sentiu ciúme do sucesso de alguém? E você é um artista, precisa saber como lidar com ciúme e inveja, porque sempre haverá alguém mais talentoso, mais bem sucedido, mais em destaque, mais atraente ou mais proeminente no ministério que você (pág.123).
O ciúme e a inveja são formas de rivalidade oriundas da insegurança. Todo artista teme não ser talentoso o suficiente. O ciúme e a inveja são frutos do medo de ser deixado de lado pelos holofotes. São frutos do medo do anonimato e falta de reconhecimento. Diferente do artista comum, Deus chama o artista cristão para trabalhar em equipe, extinguindo por isso todo sentimento de rivalidade através do diálogo e profunda devoção a Deus.
Deus nos quer trabalhando juntos, e não um contra o outro. Em vez de competirmos uns contra os outros, podemos aprender muito uns com os outros. Podemos ser irmãos e irmãs ao invés de rivais (...). É um sinal de caráter quando não mais nos sentimos ameaçados pelos talentos e habilidades de outros. Isso é resultado de estarmos seguros sobre quem somos como indivíduos, como artistas únicos e individuais, e de confiarmos na obra de Deus em nossas vida (pág.133).
Como um ser predominantemente instável, todo artista tende a ser intensamente emotivo. Daí rompantes exagerados de fúria e felicidade, numa confusa mistura de sentimentos quando em grupo. Seriam as emoções amigas ou inimigas do artista cristão? Poderiam as mesmas lhe auxiliar ou prejudicar em sua vida cristã? Alegrias e tristezas são experiências naturais de todo ser humano. O artista cristão transforma essas experiências em adoração. Particularmente, em adoração comunitária. Com isso, é como se ele dissesse a Deus: “Seja na dor ou na alegria, somos de Cristo e estamos com ele sempre”.
Foster escreve: “nós podemos ter um sentimento de sequidão, solidão, mesmo perdição. Qualquer dependência extrema sobre a vida emocional é retirada. A noção frequentemente ouvida hoje de que tais experiências deveriam ser evitadas e que devemos viver em paz, conforto, alegria e celebração, apenas nega o fato de que muito da experiência contemporânea é conversa superficial. A noite escura é uma daquelas maneiras que Deus usa para levar-nos à quietude, ao repouso, a fim de que possamos produzir uma transformação interior em nossa alma (pág. 142).
É preciso saber controlar as emoções. Sua intensidade pode gerar circunstâncias que fogem do nosso controle, inclusive ao pecado.
Quem você está seguindo?
É impressionante!
O início da igreja é marcado por um vigor extraordinário, de amor inconseqüente a mensagem da cruz e a todo o legado de Jesus Cristo. De tão inconseqüente esse amor é desafiador, é contestador. Inúmeras são as prisões por insubmissão à idolatria romana, os martírios, as fugas por causa da perseguição. Entretanto, em paralelo estão os grandes sermãos dos apóstolos, cheios de entusiasmo, as campanhas missionárias, o crescimento explosivo da fé em menos de cinqüenta anos, a vida comunitária dos primeiros cristãos, pois todos os que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e fazendas, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister (At. 2.44-45). Olhando para o passado, o presente parece apenas uma caricatura daquilo que foi o cristianismo em sua forma primitiva. De fato, tal evidência é um tanto incômoda e perturbadora – Somos de fato cristãos? Nossas ações testificam isso? Como entender tanta ousadia por parte da igreja primitiva? Se considerarmos tal ousadia como um fenômeno do Espírito Santo, arriscaria uma nova pergunta: Nós não temos do mesmo Espírito? Se considerarmos tal ousadia como um fenômeno da fé arriscaria: Nós não temos fé? O que temos então? O que somos então?
De fato, não é apenas pela expressiva militância que a primeira geração de cristãos se destaca de todas as gerações posteriores. A primeira geração de cristãos se destaca por terem sido a geração que testemunhou toda a vida, ensino, crucificação, morte e ressurreição de Jesus. Isso faz toda a diferença: ao ser crucificado Cristo é condenado pelo mundo, ao ressuscitar Cristo se torna o juiz do mundo e promete voltar para esse fim. A eminente volta de Jesus gera intensa expectativa, e diante dela, a conduta pessoal e comunitária se torna uma preocupação permanente. Como Tomé, a primeira geração de cristãos se distingue das demais por ser uma geração que creu apenas por que viu. O tempo passa e os martírios e a velhice começam a dar fim à primeira geração cristã. Deixam uma herança na fé: semeiam a geração porvir.
Entre os últimos da primeira geração estão Tiago e João. Apóstolos que inauguram a nova geração cristã. Uma geração que creu no que não viu: ... bem aventurados os que não viram e creram (Jo. 20.29). A segunda geração de cristãos é marcada precisamente por consolidar o cristianismo, motivados pelo ardor explosivo e exemplo da primeira geração, particularmente, os apóstolos. Com o progressivo martírio dos apóstolos, esse ardor diminui: surgem os problemas de imoralidade comunitária e pessoal, inúmeras disputas por poder e a criação de concessões para a diminuição de perseguições. O apóstolo João, como um dos últimos dos apóstolos se preocupa como o futuro das próximas gerações cristãs. Preocupação maior tem Jesus Cristo. Surge o apocalipse, especificadamente as cartas às sete igrejas, dentre elas, Pérgamo.
Pérgamo era uma cidade profundamente devotada à riqueza, a moda e ao misticismo. Onde foi inventado o pergaminho, recebendo seu nome justamente por causa dessa fonte de riqueza econômica. Possuía uma grande biblioteca que rivalizava com a de Alexandria em quantidade de livros. Era uma cidade profundamente mística e idólatra, por onde se desenvolveram cultos às mais variadas formas de divindades, como Zeus, Asclépio e Dionísio. Em 70 a.C. foi erigido um altar para a adoração de Augusto, imperador romano, tornando-se por conta disso o centro do culto ao imperador. Inevitavelmente o poder da igreja rivaliza com o as forças do inimigo. João, usando de uma metáfora, compara o trono do imperador Augusto como o trono do próprio diabo, por razões óbvias: por meio de um decreto, sob a penalidade de morte, ordenou que todo súdito do império romano deveria dirigir-lhe como “deus e senhor”, títulos que os cristãos atribuem unicamente a Jesus Cristo. Surge então um embate. Diante de tal conflito entre o império e a igreja, esta última tem o seu caráter provado: uns preferem a fé a própria vida, enquanto outros, preferem a vida a fé, e se submetem aos interesses dos poderes que dominam. A perseguição então se revela como um meio por onde os corações são provados e suas intenções reveladas.
Há os que seguem a Cristo (vv.13 e 17): e por isso estão prontos a morrer por ele, sem se preocupar com as conseqüências dessa decisão. É o caso de Antipas, possivelmente um grande líder mártir da igreja em Pérgamo. Simeão Metafrastes, contava a história lendária acerca de um certo Antipas, bispo de pérgamo, o qual nos tempos do imperador Domiciano foi fechado dentro de um boi de bronze, aquecido ao rubro. Seu corpo foi literalmente cozido. Diz-se que ele terminou seus últimos momentos em louvor e adoração. Exemplo entre as testemunhas de Jesus que retém o seu nome e não negam a fé.
Porque todo aquele que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé (1ª Jo. 5.4).
A fé vence o mundo! Quanto mais a força de um império! Entretanto, é preciso resistência. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: Ao vencedor, dar-lhe-ei do maná escondido, bem como lhe darei uma pedrinha branca, e sobre esta pedrinha escrito um nome novo, o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe (vv. 17). Pérgamo também se ocupava economicamente da mineração e comercialização de pedras brancas, utilizada para diversas finalidades: eram dadas aos que sofreram processos judiciais e foram absolvidos – prova de inocência. Era dada ao escravo liberto e que se tornara cidadão da província – prova de sua cidadania: Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador. O Senhor Jesus Cristo, o qual transformará o nosso corpo de humilhação, para ser igual ao da sua glória, segundo a eficácia do poder que ele tem de até subordinar a si todas as coisas (Fl. 3.20-21). Era também conferido aos vencedores das corridas ou lutas – prova de vitória: Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que vos amou (Rm.8.37). Era conferida ao guerreiro quando voltava da batalha – prova de coragem.
Há os que seguem a doutrina de Balaão e dos Nicolaítas: O termo nicolaíta tem um sentido ambíguo: é formado pelas palavras gregas nikh ( que significa domínio ) e laos/ laikos ( que significa leigo, gente, multidão, povo ). Literalmente “Os que exercem domínio sobre o povo”. Faziam parte de uma seita gnóstica que pregava a supremacia dos que administravam o culto (liturgia, palavra e etc..) das demais pessoas. No que se refere a moral, pregavam que o corpo é amoral no que se refere à espiritualidade, sendo assim, indiferente a salvação e santificação, sendo por isso, toleráveis quanto à promiscuidade. Daí alguns exegetas traduzirem nikh também por “destruir”. Nicolaítas também poderia ser traduzido como “Os que destoem o povo”, tal como Balaão.
Quem você está seguindo?: Onde os seus passos o estão levando em sua carreira cristã?
Nossas igrejas hoje, são marcadas pela fantasia de que números definem espiritualidade. Dentro das comunidades cristãs o altar se tornou um bem de consumo, e por isso, uma fonte de status e popularidade. Consequentemente, motivo para inúmeras disputas por poder. Desse modo, o altar se tornou o indicador de um enganoso tipo de santidade que faz do sagrado momento de culto apenas um espetáculo bem encenado, apenas uma forma de entretenimento: se esquece a quem se cultua, isso porque não se sabe por que se cultua. Soren Kierkegaard, teólogo e filósofo dinamarquês do séc. XIX, afirmou que a cristandade (a instituição cristã) aboliu o cristianismo em nome de Cristo. Seguir a Cristo é ser recíproco ao seu sacrifício na cruz: Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos (1ª Jo. 3.16).
Conclusão
Ser cristão consiste precisamente em seguir os mesmos passos que Jesus e prosseguir em seu caminho. É dar continuidade ao seu legado através da história e na eternidade. É escrever a história de Deus entre os homens. É implantar o seu reino nos corações. Isso não pode acontecer sem que haja tensões. Deus e o diabo brigam pelo mesmo espaço: o corações dos homens. Tropeções, quedas, momentos de desânimo e tristeza são naturais em toda a caminhada. A fidelidade a Deus responde em todos esses momentos. É exatamente esse o significado da palavra fé (fides em latim, que significa fidelidade). Ser fiel é uma condição para todas as instâncias, tal como num casamento quando os noivos prometem um ao outro: na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença, na alegria ou na dor e etc. Cristo louva aqueles que em face das dificuldades e perseguições não negam o seu nome, da mesma maneira que repreende e exorta ao arrependimento aqueles que em face de terem suas vidas ameaçadas pela perseguição, trocam a fé pela própria vida. A fé cristã é uma fé de mártires, logo, de pessoas decididas a amarem mais a Deus do que a si mesmas.
O início da igreja é marcado por um vigor extraordinário, de amor inconseqüente a mensagem da cruz e a todo o legado de Jesus Cristo. De tão inconseqüente esse amor é desafiador, é contestador. Inúmeras são as prisões por insubmissão à idolatria romana, os martírios, as fugas por causa da perseguição. Entretanto, em paralelo estão os grandes sermãos dos apóstolos, cheios de entusiasmo, as campanhas missionárias, o crescimento explosivo da fé em menos de cinqüenta anos, a vida comunitária dos primeiros cristãos, pois todos os que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e fazendas, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister (At. 2.44-45). Olhando para o passado, o presente parece apenas uma caricatura daquilo que foi o cristianismo em sua forma primitiva. De fato, tal evidência é um tanto incômoda e perturbadora – Somos de fato cristãos? Nossas ações testificam isso? Como entender tanta ousadia por parte da igreja primitiva? Se considerarmos tal ousadia como um fenômeno do Espírito Santo, arriscaria uma nova pergunta: Nós não temos do mesmo Espírito? Se considerarmos tal ousadia como um fenômeno da fé arriscaria: Nós não temos fé? O que temos então? O que somos então?
De fato, não é apenas pela expressiva militância que a primeira geração de cristãos se destaca de todas as gerações posteriores. A primeira geração de cristãos se destaca por terem sido a geração que testemunhou toda a vida, ensino, crucificação, morte e ressurreição de Jesus. Isso faz toda a diferença: ao ser crucificado Cristo é condenado pelo mundo, ao ressuscitar Cristo se torna o juiz do mundo e promete voltar para esse fim. A eminente volta de Jesus gera intensa expectativa, e diante dela, a conduta pessoal e comunitária se torna uma preocupação permanente. Como Tomé, a primeira geração de cristãos se distingue das demais por ser uma geração que creu apenas por que viu. O tempo passa e os martírios e a velhice começam a dar fim à primeira geração cristã. Deixam uma herança na fé: semeiam a geração porvir.
Entre os últimos da primeira geração estão Tiago e João. Apóstolos que inauguram a nova geração cristã. Uma geração que creu no que não viu: ... bem aventurados os que não viram e creram (Jo. 20.29). A segunda geração de cristãos é marcada precisamente por consolidar o cristianismo, motivados pelo ardor explosivo e exemplo da primeira geração, particularmente, os apóstolos. Com o progressivo martírio dos apóstolos, esse ardor diminui: surgem os problemas de imoralidade comunitária e pessoal, inúmeras disputas por poder e a criação de concessões para a diminuição de perseguições. O apóstolo João, como um dos últimos dos apóstolos se preocupa como o futuro das próximas gerações cristãs. Preocupação maior tem Jesus Cristo. Surge o apocalipse, especificadamente as cartas às sete igrejas, dentre elas, Pérgamo.
Pérgamo era uma cidade profundamente devotada à riqueza, a moda e ao misticismo. Onde foi inventado o pergaminho, recebendo seu nome justamente por causa dessa fonte de riqueza econômica. Possuía uma grande biblioteca que rivalizava com a de Alexandria em quantidade de livros. Era uma cidade profundamente mística e idólatra, por onde se desenvolveram cultos às mais variadas formas de divindades, como Zeus, Asclépio e Dionísio. Em 70 a.C. foi erigido um altar para a adoração de Augusto, imperador romano, tornando-se por conta disso o centro do culto ao imperador. Inevitavelmente o poder da igreja rivaliza com o as forças do inimigo. João, usando de uma metáfora, compara o trono do imperador Augusto como o trono do próprio diabo, por razões óbvias: por meio de um decreto, sob a penalidade de morte, ordenou que todo súdito do império romano deveria dirigir-lhe como “deus e senhor”, títulos que os cristãos atribuem unicamente a Jesus Cristo. Surge então um embate. Diante de tal conflito entre o império e a igreja, esta última tem o seu caráter provado: uns preferem a fé a própria vida, enquanto outros, preferem a vida a fé, e se submetem aos interesses dos poderes que dominam. A perseguição então se revela como um meio por onde os corações são provados e suas intenções reveladas.
Há os que seguem a Cristo (vv.13 e 17): e por isso estão prontos a morrer por ele, sem se preocupar com as conseqüências dessa decisão. É o caso de Antipas, possivelmente um grande líder mártir da igreja em Pérgamo. Simeão Metafrastes, contava a história lendária acerca de um certo Antipas, bispo de pérgamo, o qual nos tempos do imperador Domiciano foi fechado dentro de um boi de bronze, aquecido ao rubro. Seu corpo foi literalmente cozido. Diz-se que ele terminou seus últimos momentos em louvor e adoração. Exemplo entre as testemunhas de Jesus que retém o seu nome e não negam a fé.
Porque todo aquele que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé (1ª Jo. 5.4).
A fé vence o mundo! Quanto mais a força de um império! Entretanto, é preciso resistência. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: Ao vencedor, dar-lhe-ei do maná escondido, bem como lhe darei uma pedrinha branca, e sobre esta pedrinha escrito um nome novo, o qual ninguém conhece, exceto aquele que o recebe (vv. 17). Pérgamo também se ocupava economicamente da mineração e comercialização de pedras brancas, utilizada para diversas finalidades: eram dadas aos que sofreram processos judiciais e foram absolvidos – prova de inocência. Era dada ao escravo liberto e que se tornara cidadão da província – prova de sua cidadania: Pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador. O Senhor Jesus Cristo, o qual transformará o nosso corpo de humilhação, para ser igual ao da sua glória, segundo a eficácia do poder que ele tem de até subordinar a si todas as coisas (Fl. 3.20-21). Era também conferido aos vencedores das corridas ou lutas – prova de vitória: Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que vos amou (Rm.8.37). Era conferida ao guerreiro quando voltava da batalha – prova de coragem.
Há os que seguem a doutrina de Balaão e dos Nicolaítas: O termo nicolaíta tem um sentido ambíguo: é formado pelas palavras gregas nikh ( que significa domínio ) e laos/ laikos ( que significa leigo, gente, multidão, povo ). Literalmente “Os que exercem domínio sobre o povo”. Faziam parte de uma seita gnóstica que pregava a supremacia dos que administravam o culto (liturgia, palavra e etc..) das demais pessoas. No que se refere a moral, pregavam que o corpo é amoral no que se refere à espiritualidade, sendo assim, indiferente a salvação e santificação, sendo por isso, toleráveis quanto à promiscuidade. Daí alguns exegetas traduzirem nikh também por “destruir”. Nicolaítas também poderia ser traduzido como “Os que destoem o povo”, tal como Balaão.
Quem você está seguindo?: Onde os seus passos o estão levando em sua carreira cristã?
Nossas igrejas hoje, são marcadas pela fantasia de que números definem espiritualidade. Dentro das comunidades cristãs o altar se tornou um bem de consumo, e por isso, uma fonte de status e popularidade. Consequentemente, motivo para inúmeras disputas por poder. Desse modo, o altar se tornou o indicador de um enganoso tipo de santidade que faz do sagrado momento de culto apenas um espetáculo bem encenado, apenas uma forma de entretenimento: se esquece a quem se cultua, isso porque não se sabe por que se cultua. Soren Kierkegaard, teólogo e filósofo dinamarquês do séc. XIX, afirmou que a cristandade (a instituição cristã) aboliu o cristianismo em nome de Cristo. Seguir a Cristo é ser recíproco ao seu sacrifício na cruz: Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos (1ª Jo. 3.16).
Conclusão
Ser cristão consiste precisamente em seguir os mesmos passos que Jesus e prosseguir em seu caminho. É dar continuidade ao seu legado através da história e na eternidade. É escrever a história de Deus entre os homens. É implantar o seu reino nos corações. Isso não pode acontecer sem que haja tensões. Deus e o diabo brigam pelo mesmo espaço: o corações dos homens. Tropeções, quedas, momentos de desânimo e tristeza são naturais em toda a caminhada. A fidelidade a Deus responde em todos esses momentos. É exatamente esse o significado da palavra fé (fides em latim, que significa fidelidade). Ser fiel é uma condição para todas as instâncias, tal como num casamento quando os noivos prometem um ao outro: na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença, na alegria ou na dor e etc. Cristo louva aqueles que em face das dificuldades e perseguições não negam o seu nome, da mesma maneira que repreende e exorta ao arrependimento aqueles que em face de terem suas vidas ameaçadas pela perseguição, trocam a fé pela própria vida. A fé cristã é uma fé de mártires, logo, de pessoas decididas a amarem mais a Deus do que a si mesmas.
Sermão Cerimonial
†Jo. 8.1-11.
Deixar-se vencer pelo amor, não resistir a ele. Não o amor transitório de paixões, fundado em benefício próprio e satisfação pessoal, fruto secreto de uma profunda carência emotiva que impulsiona desesperadamente a lançar-se diante de braços estranhos, indiferentes, mas sim, o amor que vai ao encontro do outro, lhe reconhece, lhe identifica diante de Deus, amor que identifica criador e criatura. Que promove um encontro. E assim foi entre Jesus e uma mulher apanhada em adultério.
Tal relato se encontra precisamente entre dois grandes discursos de Jesus: um sobre sua pessoa (Jo. 7.10-53) e outro sobre sua missão (Jo. 8.12- 59). Jesus participa da festa dos tabernáculos, uma festa cerimonial judaica de uma semana cujo fim era lembrar ao povo o tempo em que seus ancestrais ainda viviam em tendas quando peregrinavam no deserto depois do êxodo. Nessa festa Jesus discursa sobre sua identidade. Contudo, inserido neste discurso estão severas críticas ao modo de administração da lei feita pelos sacerdotes, assim como, o modo como interpretam a lei e os procedimentos utilizados sobre ela para exercerem qualquer tipo de julgamento, dentre eles, sobre quem era Jesus. Isso é interpretado pelos escribas e fariseus como um tipo de provocação, procurando por isso a todo custo, matá-lo.
Terminada a festa Jesus resolve passar a noite no monte das oliveiras em oração. Antes do nascer do sol se dirige ao templo e começa a ensinar. É exatamente nesse momento de cansaço físico e mental que os principais da sinagoga lhe resolvem testar – uma clara resposta ao discurso de Jesus feito um dia antes. Baseados nas afirmações de Jesus sobre como interpretam a lei, trazem em sua presença uma mulher apanhada em adultério. Alheia a tais embates entre Jesus e os principais da Sinagoga, ela é simplesmente usada como um meio para condenar Jesus à morte. Morrendo Jesus ela também morreria. Entretanto, conseguindo livrar-se da armadilha, a mulher também seria preservada com vida. Ironicamente a vida dela estava nas mãos de Jesus, não dos seus algozes. Nesses momentos de tensão, onde Deus, incompreendido, parece ser um tirano cruel, onde não conseguimos enxergar tão longe a fim de compreender seus desígnos, Isaías nos ensina que quando nossa cegueira espiritual (que pode ou não ser oriunda de um pecado) nos impede de enxergar o mesmo que Deus, devemos apenas estender as mãos e deixar-nos guiar por ele (Is.45. 1-5).
E, pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre, esta mulher foi apanhada, no próprio ato adulterando, e na lei nos mandou Moisés que as tais sejam apedrejadas. Tu pois que dizes?. Isto diziam eles, tentando-o, para que tivessem de que o acusar ... (vv.5-6).
Por um momento Jesus se calou. Escrevia na terra. Depois de uma pausa, Cristo responde a provocação com a já clássica afirmação:
... Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela (v.7).
Todos são iguais à mulher adúltera. Condená-la seria reconhecer em si mesmo a necessidade de punição, e por isso mesmo, de morte. Todos se retiram, maculados pelos seus próprios pecados e consciências, e por isso, continuam pecadores, condenados pela justiça de Deus, mortos. Estão conformados com as suas vidas. Só a mulher permanece com Jesus. E por isso ela é perdoada. Um pecador quando diante de Cristo possui apenas a escolha de renunciar a Cristo ou os seus pecados. Por isso a recomendação de Jesus à mulher: Vai-te, e não peques mais (v.11).
Como julgar uma pessoa livre? Nem mesmo Cristo Julga. Martin Heidegger certa vez escreveu que apenas nos definimos quando morremos. É por essa razão que o julgamento de Jesus é escatológico, onde separará bodes de ovelhas. Para o Judaísmo do primeiro século a lei definia moralmente os indivíduos em bons ou maus, em santos e pecadores, em salvos e condenados. Com a corrupção da lei feita pelos sacerdotes, a lei somente poderia ter uma aplicação válida quando administrada pelo seu próprio autor: Cristo julga! E perdoa. Renuncia a lei? Apenas ensina a sua função: humanizar o homem, isto é, coloca-lo diante de seu criador.
Karl Barth escreveu sobre o amor de Cristo:
O amor não é Eros, que se cobiça, mas Ágape, que jamais acabará;
A novidade, a originalidade do amor é ele não participar do círculo vicioso que vai do mal ao mal e da reação à revolução;
O amor é a “justiça eterna equalizadora” (Kierkegaard);
O amor edifica a comunidade porque unicamente procura comunhão;
O amor nada espera porque já atingiu o alvo;
Nada procura, porque já encontrou;
Nada quer enquanto já realizou;
Nada pergunta, porque já sabe;
Não luta, porque já venceu;
O amor não contradiz e, por isso não pode ser refutado;
Não concorre, e, portanto, não é vencido;
Não busca decisão e, consequentemente, ele próprio é a decisão;
O amor destrói os ídolos, porque não cria outros.
Deixar-se vencer pelo amor, não resistir a ele. Não o amor transitório de paixões, fundado em benefício próprio e satisfação pessoal, fruto secreto de uma profunda carência emotiva que impulsiona desesperadamente a lançar-se diante de braços estranhos, indiferentes, mas sim, o amor que vai ao encontro do outro, lhe reconhece, lhe identifica diante de Deus, amor que identifica criador e criatura. Que promove um encontro. E assim foi entre Jesus e uma mulher apanhada em adultério.
Tal relato se encontra precisamente entre dois grandes discursos de Jesus: um sobre sua pessoa (Jo. 7.10-53) e outro sobre sua missão (Jo. 8.12- 59). Jesus participa da festa dos tabernáculos, uma festa cerimonial judaica de uma semana cujo fim era lembrar ao povo o tempo em que seus ancestrais ainda viviam em tendas quando peregrinavam no deserto depois do êxodo. Nessa festa Jesus discursa sobre sua identidade. Contudo, inserido neste discurso estão severas críticas ao modo de administração da lei feita pelos sacerdotes, assim como, o modo como interpretam a lei e os procedimentos utilizados sobre ela para exercerem qualquer tipo de julgamento, dentre eles, sobre quem era Jesus. Isso é interpretado pelos escribas e fariseus como um tipo de provocação, procurando por isso a todo custo, matá-lo.
Terminada a festa Jesus resolve passar a noite no monte das oliveiras em oração. Antes do nascer do sol se dirige ao templo e começa a ensinar. É exatamente nesse momento de cansaço físico e mental que os principais da sinagoga lhe resolvem testar – uma clara resposta ao discurso de Jesus feito um dia antes. Baseados nas afirmações de Jesus sobre como interpretam a lei, trazem em sua presença uma mulher apanhada em adultério. Alheia a tais embates entre Jesus e os principais da Sinagoga, ela é simplesmente usada como um meio para condenar Jesus à morte. Morrendo Jesus ela também morreria. Entretanto, conseguindo livrar-se da armadilha, a mulher também seria preservada com vida. Ironicamente a vida dela estava nas mãos de Jesus, não dos seus algozes. Nesses momentos de tensão, onde Deus, incompreendido, parece ser um tirano cruel, onde não conseguimos enxergar tão longe a fim de compreender seus desígnos, Isaías nos ensina que quando nossa cegueira espiritual (que pode ou não ser oriunda de um pecado) nos impede de enxergar o mesmo que Deus, devemos apenas estender as mãos e deixar-nos guiar por ele (Is.45. 1-5).
E, pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre, esta mulher foi apanhada, no próprio ato adulterando, e na lei nos mandou Moisés que as tais sejam apedrejadas. Tu pois que dizes?. Isto diziam eles, tentando-o, para que tivessem de que o acusar ... (vv.5-6).
Por um momento Jesus se calou. Escrevia na terra. Depois de uma pausa, Cristo responde a provocação com a já clássica afirmação:
... Aquele que dentre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela (v.7).
Todos são iguais à mulher adúltera. Condená-la seria reconhecer em si mesmo a necessidade de punição, e por isso mesmo, de morte. Todos se retiram, maculados pelos seus próprios pecados e consciências, e por isso, continuam pecadores, condenados pela justiça de Deus, mortos. Estão conformados com as suas vidas. Só a mulher permanece com Jesus. E por isso ela é perdoada. Um pecador quando diante de Cristo possui apenas a escolha de renunciar a Cristo ou os seus pecados. Por isso a recomendação de Jesus à mulher: Vai-te, e não peques mais (v.11).
Como julgar uma pessoa livre? Nem mesmo Cristo Julga. Martin Heidegger certa vez escreveu que apenas nos definimos quando morremos. É por essa razão que o julgamento de Jesus é escatológico, onde separará bodes de ovelhas. Para o Judaísmo do primeiro século a lei definia moralmente os indivíduos em bons ou maus, em santos e pecadores, em salvos e condenados. Com a corrupção da lei feita pelos sacerdotes, a lei somente poderia ter uma aplicação válida quando administrada pelo seu próprio autor: Cristo julga! E perdoa. Renuncia a lei? Apenas ensina a sua função: humanizar o homem, isto é, coloca-lo diante de seu criador.
Karl Barth escreveu sobre o amor de Cristo:
O amor não é Eros, que se cobiça, mas Ágape, que jamais acabará;
A novidade, a originalidade do amor é ele não participar do círculo vicioso que vai do mal ao mal e da reação à revolução;
O amor é a “justiça eterna equalizadora” (Kierkegaard);
O amor edifica a comunidade porque unicamente procura comunhão;
O amor nada espera porque já atingiu o alvo;
Nada procura, porque já encontrou;
Nada quer enquanto já realizou;
Nada pergunta, porque já sabe;
Não luta, porque já venceu;
O amor não contradiz e, por isso não pode ser refutado;
Não concorre, e, portanto, não é vencido;
Não busca decisão e, consequentemente, ele próprio é a decisão;
O amor destrói os ídolos, porque não cria outros.
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Sermão Cerimonial
Em ocasião do lançamento do livro “O Deus de Carne”
na Paróquia Anglicana da Santíssima Trindade em Copacabana
no dia 14 de março de 2009.
Mt. 14. 22-31
Mt. 25. 14-30
Ap. 4. 4; 10-11
Irmãos e irmãs,
Estamos hoje reunidos em culto solene de gratidão a Deus pela sua obra realizada em nós. Que nos inspira, com o sopro de seu Espírito, a louvar o seu nome e a comunicar a plenos pulmões a boa nova do evangelho. Até mesmo se utilizando da escrita para tal empenho. A mesma vocação dos santos apóstolos e profetas. A mesma vocação do próprio Deus, autor da nossa fé, da nossa nova vida em Cristo. Em tom poético, arriscaria dizer que Deus também é escritor.
Entretanto, desejo confessar uma preocupação : me sinto intensamente pressionado pelas circunstâncias ao redor a trair todos os meus ideais mais valiosos, ao sentido de toda a minha vida, me sinto pressionado a me tornar um homem comum. Talvez eu mate o idealista revolucionário que existe em mim. De anarquista, escolha participar de algum partido político, me torne um
funcionário público, tenha um bom salário, uma bela esposa, constitua uma família linda. De intelectual, talvez eu queime todos os meus livros e esqueça meu amor pela causa da verdade: não se dá para sobreviver só de idealismo, é preciso comer, vestir, um lugar para morar, ter um pouco de conforto e um bom nome na sociedade. De cristão eu me torne ateu e do céu eu prefira o inferno. E no final de uma curta ou longa velhice, eu morra com a sensação comum de muitos de meus contemporâneos de ter jogado a vida no lixo, ou melhor, na sepultura. De ter comido, bebido, casado, tido filhos, até que chegue o dilúvio, o meu dilúvio e me surpreenda. E depois de submerso na sepultura, seja completamente esquecido pelas gerações futuras, e depois de uns cinquenta anos de morto, ninguém mais saiba quem eu fui. Enfim, um homem comum, anônimo, imerso na multidão de vivos e de mortos. Não se trata de se ter fama ou sucesso, mas do desejo sincero de deixar um legado. Será que eu consigo parar de escrever, e deixar de ter a obsessão de querer legar meu nome e
um exemplo para as gerações futuras? Clarice Lispector escreveu sobre a vocação de escritor:
Escrevo por não ter nada o que fazer no mundo: sobrei e não há lugar pra mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu morreria simbolicamente todos os dias.
Diferente dela, acredito que é exatamente o hábito de escrever, que me insere no cotidiano de maneira crítica. Não sou apenas um observador do mundo, mas também participante direto do seu destino, ou seja, efeito e causa de sua história. Ser escritor, ainda mais cristão, me compromete a expressar, em parte com cérebro e noutra com o coração, através da devoção, essa caótica síntese que é viver entre o espiritual e o carnal ( como diria uma antiga fórmula luterana: semper peccator, semper iustus, semper paenitens ), deixando para as gerações posteriores simultaneamente um testemunho crítico do meu tempo, de mim mesmo e da minha fé. Esse é o meu legado, que talvez possa inspirar uma dezena de homens, quem sabe até menos que isso, e os motive a não querer passar pela vida como simples atores, porque viver não é tão fácil com decorar falas e atos dos personagens contidos num texto. Alguns como coadjuvantes, outros como atores principais, mas Deus nos chama para que de atores na vida, sejamos quem a escreve, para isso é preciso que se viva de verdade. Que tenhamos identidade espiritual, que sejamos reconhecidos pelo criador como filhos, e não deixados à orfandade espiritual. Jesus inspirou doze,
até mesmo quem o traiu. Sendo assim, não me conformo com o destino que muitas pessoas ao meu redor querem que eu tenha. Ando em cima das águas em direção ao meu mestre, temeroso pelas ondas e o vento, espantado por ter os pés em cima das ondas: Tende bom ânimo, sou eu, não temais. Disse Jesus a Pedro. Hoje, Jesus se dirige a nós e diz: .. tende bom ânimo, eu venci o mundo1. Ânimo! Pois Cristo está a espera. Mas as ondas e o vento parecem ser mais fortes e eu pequeno demais para suportar toda a violência de um mundo hostil a própria vida. Sinto as águas me envolverem: Senhor, salva-
me! A mão do meu Senhor se estende em socorro, e com ela, outras mãos se estendem também, e eu não poderia deixar de agradecer - las nesta oportunidade:
Insisto, como fiz no primeiro livro, mesmo com ressalvas, em agradecer a mulher que me fez conhecer a Cristo – Esse é o legado dela:
Não lhe agradeço por ter me dado a vida: ela não é sua. Todavia, lhe agradeço por fazer dela, exatamente nos momentos em que me faltaram os amigos, as palavras e até mesmo a força para continuar vivendo, momentos em que me fizeram recordar da maior herança que você pode me dar: a minha fé. Caminho que sigo sozinho, mas que sem você talvez eu não teria encontrado a direção certa.
Agradeço a minha congregação, a Igreja Batista de Vila Norma, por ter apoiado desde o início, com o meu primeiro livro, minha loucura em querer ser escritor, ao irmão em Cristo, grande amigo e mestre, rev. Carlos Alberto, que rendeu para este projeto inestimáveis contribuições de revisão e sugestões para o texto, juntamente com toda a sua congregação, que nos receberam, a mim e
toda a minha igreja, com todo carinho e dedicação, próprios de irmãos, deixando de lado as diferenças teológicas a fim de manter o propósito comum de nos reunirmos verdadeiramente ao redor de Jesus Cristo. Agradeço a todos que dedicaram seus esforços direta ou indiretamente com idéias, empenho e com a própria presença para a realização deste ato solene. É inestimável o valor de todos vocês para a minha vida. Senhor, nós hoje te entregamos apenas o que é teu, e muito mais que isso, de dois ou cinco talentos, fazemos quatro ou dez, e mesmo assim, envergonhado diante desta congregação, diante de todos os anjos, santos e seres que povoam o céu e diante de ti mesmo ó Deus, penso comigo mesmo: sou um servo inútil porque fiz apenas o que deveria fazer2 , sou apenas o que deveria ser. Mas o senhor nos diz: Bem está, servo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. E prostrados aos teus pés, entregamos a nossa coroa
diante do teu trono, a mesma que hoje, aqui e agora, nos concede pela tua grande misericórdia:
Digno és, Senhor, de receber glória, e honra, e poder; porque tu criaste todas as coisas, e por tua vontade são e foram criadas.
Amigos e irmãos em Cristo, não pensem que é por algum tipo de talento meu que estamos aqui reunidos. Se assim fosse, creio que depois de lerem o livro que hoje os apresento, muitos se lamentariam por terem jogado dinheiro fora. Não, não é por esse motivo que nós estamos aqui : mas sim porque Deus está cumprindo uma promessa, e não só isso, Deus está cumprindo uma promessa a alguém que sinceramente tem consciência de que não a merece. Como bem
profetizou Isaías : Levanta em redor os teus olhos, e vê; todos estes já se ajuntaram, e vêm a ti (...) . Então o verás, e serás iluminado, e o teu coração estremecerá e se alargará3. Meu coração hoje estremece – de alegria. Isso é um milagre, o meu milagre, e Deus é louvado por isso. É exatamente por esse motivo que o criador nos presenteia com este dia: para glorificá-lo, porque tudo é dele, e nós somos apenas obra de suas mãos. Cristo é o centro, e nós apenas os horbis iluminados por sua presença, situados a sua volta. Porque nós passamos, mas ele permanece para sempre. Glorifiquemos a Cristo e tudo o que ele faz por nós. Antes que as palavras fujam, somente me resta, sinceramente à Deus lhe dirigir em oração o agradecimento:
Quem é como o Senhor nosso Deus, que habita nas alturas; que se curva; para ver o que está nos céus e na terra; que do pó levanta o pequeno, e do monturo ergue o necessitado, para o fazer assentar com os príncipes, sim, com os príncipes do seu povo4.
Por fim, gostaria de dizer a todos o meu muito obrigado, que Deus os abençoe e os inspire com fé e ousadia a sermos fiéis aos seus designos.
na Paróquia Anglicana da Santíssima Trindade em Copacabana
no dia 14 de março de 2009.
Mt. 14. 22-31
Mt. 25. 14-30
Ap. 4. 4; 10-11
Irmãos e irmãs,
Estamos hoje reunidos em culto solene de gratidão a Deus pela sua obra realizada em nós. Que nos inspira, com o sopro de seu Espírito, a louvar o seu nome e a comunicar a plenos pulmões a boa nova do evangelho. Até mesmo se utilizando da escrita para tal empenho. A mesma vocação dos santos apóstolos e profetas. A mesma vocação do próprio Deus, autor da nossa fé, da nossa nova vida em Cristo. Em tom poético, arriscaria dizer que Deus também é escritor.
Entretanto, desejo confessar uma preocupação : me sinto intensamente pressionado pelas circunstâncias ao redor a trair todos os meus ideais mais valiosos, ao sentido de toda a minha vida, me sinto pressionado a me tornar um homem comum. Talvez eu mate o idealista revolucionário que existe em mim. De anarquista, escolha participar de algum partido político, me torne um
funcionário público, tenha um bom salário, uma bela esposa, constitua uma família linda. De intelectual, talvez eu queime todos os meus livros e esqueça meu amor pela causa da verdade: não se dá para sobreviver só de idealismo, é preciso comer, vestir, um lugar para morar, ter um pouco de conforto e um bom nome na sociedade. De cristão eu me torne ateu e do céu eu prefira o inferno. E no final de uma curta ou longa velhice, eu morra com a sensação comum de muitos de meus contemporâneos de ter jogado a vida no lixo, ou melhor, na sepultura. De ter comido, bebido, casado, tido filhos, até que chegue o dilúvio, o meu dilúvio e me surpreenda. E depois de submerso na sepultura, seja completamente esquecido pelas gerações futuras, e depois de uns cinquenta anos de morto, ninguém mais saiba quem eu fui. Enfim, um homem comum, anônimo, imerso na multidão de vivos e de mortos. Não se trata de se ter fama ou sucesso, mas do desejo sincero de deixar um legado. Será que eu consigo parar de escrever, e deixar de ter a obsessão de querer legar meu nome e
um exemplo para as gerações futuras? Clarice Lispector escreveu sobre a vocação de escritor:
Escrevo por não ter nada o que fazer no mundo: sobrei e não há lugar pra mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu morreria simbolicamente todos os dias.
Diferente dela, acredito que é exatamente o hábito de escrever, que me insere no cotidiano de maneira crítica. Não sou apenas um observador do mundo, mas também participante direto do seu destino, ou seja, efeito e causa de sua história. Ser escritor, ainda mais cristão, me compromete a expressar, em parte com cérebro e noutra com o coração, através da devoção, essa caótica síntese que é viver entre o espiritual e o carnal ( como diria uma antiga fórmula luterana: semper peccator, semper iustus, semper paenitens ), deixando para as gerações posteriores simultaneamente um testemunho crítico do meu tempo, de mim mesmo e da minha fé. Esse é o meu legado, que talvez possa inspirar uma dezena de homens, quem sabe até menos que isso, e os motive a não querer passar pela vida como simples atores, porque viver não é tão fácil com decorar falas e atos dos personagens contidos num texto. Alguns como coadjuvantes, outros como atores principais, mas Deus nos chama para que de atores na vida, sejamos quem a escreve, para isso é preciso que se viva de verdade. Que tenhamos identidade espiritual, que sejamos reconhecidos pelo criador como filhos, e não deixados à orfandade espiritual. Jesus inspirou doze,
até mesmo quem o traiu. Sendo assim, não me conformo com o destino que muitas pessoas ao meu redor querem que eu tenha. Ando em cima das águas em direção ao meu mestre, temeroso pelas ondas e o vento, espantado por ter os pés em cima das ondas: Tende bom ânimo, sou eu, não temais. Disse Jesus a Pedro. Hoje, Jesus se dirige a nós e diz: .. tende bom ânimo, eu venci o mundo1. Ânimo! Pois Cristo está a espera. Mas as ondas e o vento parecem ser mais fortes e eu pequeno demais para suportar toda a violência de um mundo hostil a própria vida. Sinto as águas me envolverem: Senhor, salva-
me! A mão do meu Senhor se estende em socorro, e com ela, outras mãos se estendem também, e eu não poderia deixar de agradecer - las nesta oportunidade:
Insisto, como fiz no primeiro livro, mesmo com ressalvas, em agradecer a mulher que me fez conhecer a Cristo – Esse é o legado dela:
Não lhe agradeço por ter me dado a vida: ela não é sua. Todavia, lhe agradeço por fazer dela, exatamente nos momentos em que me faltaram os amigos, as palavras e até mesmo a força para continuar vivendo, momentos em que me fizeram recordar da maior herança que você pode me dar: a minha fé. Caminho que sigo sozinho, mas que sem você talvez eu não teria encontrado a direção certa.
Agradeço a minha congregação, a Igreja Batista de Vila Norma, por ter apoiado desde o início, com o meu primeiro livro, minha loucura em querer ser escritor, ao irmão em Cristo, grande amigo e mestre, rev. Carlos Alberto, que rendeu para este projeto inestimáveis contribuições de revisão e sugestões para o texto, juntamente com toda a sua congregação, que nos receberam, a mim e
toda a minha igreja, com todo carinho e dedicação, próprios de irmãos, deixando de lado as diferenças teológicas a fim de manter o propósito comum de nos reunirmos verdadeiramente ao redor de Jesus Cristo. Agradeço a todos que dedicaram seus esforços direta ou indiretamente com idéias, empenho e com a própria presença para a realização deste ato solene. É inestimável o valor de todos vocês para a minha vida. Senhor, nós hoje te entregamos apenas o que é teu, e muito mais que isso, de dois ou cinco talentos, fazemos quatro ou dez, e mesmo assim, envergonhado diante desta congregação, diante de todos os anjos, santos e seres que povoam o céu e diante de ti mesmo ó Deus, penso comigo mesmo: sou um servo inútil porque fiz apenas o que deveria fazer2 , sou apenas o que deveria ser. Mas o senhor nos diz: Bem está, servo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor. E prostrados aos teus pés, entregamos a nossa coroa
diante do teu trono, a mesma que hoje, aqui e agora, nos concede pela tua grande misericórdia:
Digno és, Senhor, de receber glória, e honra, e poder; porque tu criaste todas as coisas, e por tua vontade são e foram criadas.
Amigos e irmãos em Cristo, não pensem que é por algum tipo de talento meu que estamos aqui reunidos. Se assim fosse, creio que depois de lerem o livro que hoje os apresento, muitos se lamentariam por terem jogado dinheiro fora. Não, não é por esse motivo que nós estamos aqui : mas sim porque Deus está cumprindo uma promessa, e não só isso, Deus está cumprindo uma promessa a alguém que sinceramente tem consciência de que não a merece. Como bem
profetizou Isaías : Levanta em redor os teus olhos, e vê; todos estes já se ajuntaram, e vêm a ti (...) . Então o verás, e serás iluminado, e o teu coração estremecerá e se alargará3. Meu coração hoje estremece – de alegria. Isso é um milagre, o meu milagre, e Deus é louvado por isso. É exatamente por esse motivo que o criador nos presenteia com este dia: para glorificá-lo, porque tudo é dele, e nós somos apenas obra de suas mãos. Cristo é o centro, e nós apenas os horbis iluminados por sua presença, situados a sua volta. Porque nós passamos, mas ele permanece para sempre. Glorifiquemos a Cristo e tudo o que ele faz por nós. Antes que as palavras fujam, somente me resta, sinceramente à Deus lhe dirigir em oração o agradecimento:
Quem é como o Senhor nosso Deus, que habita nas alturas; que se curva; para ver o que está nos céus e na terra; que do pó levanta o pequeno, e do monturo ergue o necessitado, para o fazer assentar com os príncipes, sim, com os príncipes do seu povo4.
Por fim, gostaria de dizer a todos o meu muito obrigado, que Deus os abençoe e os inspire com fé e ousadia a sermos fiéis aos seus designos.
Sermão Cerimonial
† Leitura antifonal: Sl. 22. 1- 31.
Em ocasião do Culto Jovem realizado na Igreja Evangélica Assembléia de Deus
Ministério dos remanescentes, no dia 7 de fevereiro de 2009.
Irmãos e irmãs,
É evidente em toda a autobiografia do rei Davi ( característica particular dos salmos ), a forte
ênfase por ele deixada, de atribuir suas virtudes de guerreiro, sua força e coragem, como oriundas exclusivamente de sua dependência a Deus1. É reconhecido por ele que o menor e o mais novo dos filhos de Jessé não nasceu para ser um homem de guerra. Seu pai lhe envia para o pasto, para cuidar das ovelhas, animais domesticados com facilidade. Como ele pôde vencer um gigante se com dificuldades suportava o peso de uma armadura e de uma espada? Como então teria conseguido defender suas ovelhas de um leão e um urso?... Porque o Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração2. É o coração desse simples pastor de ovelhas que Deus quer que lidere a nação dos hebreus. Davi se torna um rei com o coração de um pastor. Por isso ele vence, e com isso ganha aliados.
Mas quando Deus se afasta, tal circunstância motiva sua lamentação, onde reconhece que não é
forte e nem corajoso sozinho:
Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Por que te alongas das palavras do meu bramido, e não me auxilias? Deus meu, eu clamo de dia, e tu não me ouves; de noite; e não tenho sossego ( vv.1-2 ).
O salmista se queixa da distância de Deus. O maior herói de Israel está sozinho. Ele não é mais
forte e nem corajoso, mas frágil e tímido, não é mais o rei, mas traz à Deus em oração o simples
pastor de ovelhas. Deixa transparecer do seu íntimo a crença de que Deus o abandonou. É
exatamente nesse tipo de situação, de fraqueza interior e dúvidas, o momento oportuno para o
surgimento de inimigos, que ele representa bem, utilizando-se de símbolos de animais reconhecidos por sua força ( o touro, o leão, o cão e o búfalo ). Ele se queixa de solidão espiritual e
da intensa perseguição dos seus inimigos. O salmista reconhece que sozinho ele não é um guerreiro, que é insiguinificante diante do poder de Deus e dos homens. Sabe que não pode vencer um ou outro. Ele não ousa lutar com Deus, mesmo por uma benção como fez Jacó, sabe que mesmo se a conseguisse, isso lhe trairia marcas dolorosas para o resto da vida. Ele não ousa lutar contra os seus perseguidores, porque acredita que sem Deus seus esforços seriam inúteis. Mesmo sofrendo, não chama Deus de injusto ou cruel, apenas insiste em conhecer os motivos pelos quais Deus lhe permite sofrer. Um pecado esquecido? Uma provação? Ele não sabe responder. O salmista questiona o tempo de Deus. O salmista julga que Deus demora, sinal de inquietação, de desespero, é por isso que ele clama intensamente. Exige urgência em sua causa, de uma solução rápida e eficiente de Deus sobre o seu problema. A exigência de velocidade nos empreendimentos humanos nos faz acreditar que podemos julgar os empreendimentos divinos com a mesma medida, o que é um erro.
Certa vez, assistindo ao filme O Exorcista: O Início, a doutora Sara em conversa com o cético ex
padre Maryn, ao comentar os abusos que sofreu durante a segunda guerra mundial pelos nazistas exclama em tom profético: É do inferno que temos a melhor visão de Deus. E a parábola do rico e do Lázaro é um exemplo disso: abrindo os seus olhos no Hades e de longe vendo Abraão e Lázaro, não se ouve de sua boca sequer um sussurro de blasfêmia contra Deus, pelo contrário, reconhece que está lá por consequência de sua vida, o que ele pede é misericórdia. É exatamente quando estamos embaixo que somente temos como alternativa olharmos para cima: Elevo os meus olhos para os montes: de onde me virá o socorro? O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra.
Antes de prosseguir em meu caminho, e lançar o meu olhar para frente uma vez mais, elevo só, minhas mãos a ti na direção de quem eu fujo. A ti, das profundezas do meu coração, tenho dedicado altares festivos para que, em cada momento, tua voz me pudesse chamar. Sobre esses altares estão gravados em fogo estas palavras: Ao Deus desconhecido. Teu, sou eu, embora até o presente tenha me associado aos sacrílegos. Teu, sou eu, não obstante os laços que me puxam para o abismo. Mesmo querendo fugir, sinto-me forçado a servi-lo. Eu quero te conhecer, desconhecido. Tu que me penetras a alma, e qual turbilhão invades a minha vida. Tu, o incompreensível, mas meu semelhante. Quero te conhecer. Quero servir só a ti. ( Nietzsche ).
Fruto de um mundo sem Deus. Deus está morto? O homem está. A criatura sem o criador não
tem sentido, e sem sentido, o mundo passa a ser conduzido pela barbárie: A máquina expeliu o
maquinista; está correndo cegamente no espaço ( Horkheimer ). O mundo inteiro começa a ter a
sensação de que está morrendo. E Deus parece que não ouve, não fala, não vê. Sidney
Garambone, escritor brasileiro, em seu livro Eu, Deus, escreve: A ausência é a forma mais bela de presença. A ausência promove o grito de socorro do aflito que clama pela presença de Deus. Sem ausência não há grito de socorro, não há dependência da criatura pelo criador.
O salmista recorda da sua vocação, do seu chamado, e com isso reconhece o Senhor como o Deus
da sua vida. Do seu tempo, da sua história, dos seus projetos. Reconhece quem Deus é, e quem é
ele: Porém tu és santo.../ Mas eu sou verme, e não homem9. Isto significa que há um pacto, uma
aliança, que pela circunstância exige fidelidade, literalmente, que exige fé. Não se trata porém, de
se ter a mesma perspectiva de Deus, neste Salmo Davi reconhece que por não compreender os
motivos pelos quais Deus lhe permite sofrer, não consegue enxergar o mesmo que Deus. Se trata
porém de, mesmo quando não vemos o que Deus vê, deixar que ele nos guie pela mão e nos leve
onde deseja. Sinal do amparo divino diante da nossa cegueira espiritual. Embora não sabemos ao
certo por onde podemos caminhar ( como Abraão que sai sem rumo para uma terra que não
conhece e o povo hebreu no deserto ) ele vai adiante de nós. Entretanto, a grandeza de Deus não consiste em ressuscitar vivos, mas mortos. A grandeza de Deus consiste em agir apenas no fim das nossas possibilidades. Esse é o milagre. A grandeza de Deus consiste em deixar que tudo seja destruído, para que um novo céu e uma nova terra nasçam. Promessa apenas para os que crêem nele. Quando Deus permite o sofrimento do mundo e do homem, particularmente do justo, é porque ele quer construir um mundo e um homem novos:
Porque assim diz o Senhor: Como eu trouxe sobre este povo todo este grande mal, assim eu trarei sobre ele todo o bem que lhes tenho prometido.
No filme A Paixão de Cristo de Mel Gibson, uma cena em particular me levou intensamente às
lágrimas: o cansaço, aliado a intensa dor das feridas e as horas de caminhada fizeram a cruz um
peso difícil de carregar: Jesus cai no chão e Maria, sua mãe, vem ajudá-lo a se levantar. Olhando
para ela, com o rosto ensanguentado e ferido ele diz: - Veja mãe, eu faço novas todas as coisas. É
preciso passarmos pela cruz, e até morrermos nela, para dela ressuscitarmos. Novo. Glorificado. É o Cristo ressuscitado e glorificado quem diz: ... eis que faço novas todas as coisas...
Diante da perseguição e do silêncio de Deus o salmista, vendo que questionar o tempo oportuno
pela qual Deus decidirá agir é inútil, olha para o passado, e nele, encontra o sentido de sua
vocação, reconhecendo por isso a supremacia de Deus sobre a sua vida, mesmo diante da dor ( da
mesma maneira como Sadraque, Mesaque e Abed-nego estavam dispostos a morrerem por sua fé, sem esperarem com isso qualquer providência de Deus em auxílio por exemplo ). É exatamente essa confiança que garante o livramento inesperado. Deus nos chama hoje à firmeza de propósito, à maturidade espiritual. Deus nos chama para sermos fiéis. Sempre. Deus nos chama para dependermos mais dele e menos de nós próprios. Reis com corações de pastores.
Que Deus nos ajude nesse compromisso.
† Diogo Alves da Conceição Santana
Em ocasião do Culto Jovem realizado na Igreja Evangélica Assembléia de Deus
Ministério dos remanescentes, no dia 7 de fevereiro de 2009.
Irmãos e irmãs,
É evidente em toda a autobiografia do rei Davi ( característica particular dos salmos ), a forte
ênfase por ele deixada, de atribuir suas virtudes de guerreiro, sua força e coragem, como oriundas exclusivamente de sua dependência a Deus1. É reconhecido por ele que o menor e o mais novo dos filhos de Jessé não nasceu para ser um homem de guerra. Seu pai lhe envia para o pasto, para cuidar das ovelhas, animais domesticados com facilidade. Como ele pôde vencer um gigante se com dificuldades suportava o peso de uma armadura e de uma espada? Como então teria conseguido defender suas ovelhas de um leão e um urso?... Porque o Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração2. É o coração desse simples pastor de ovelhas que Deus quer que lidere a nação dos hebreus. Davi se torna um rei com o coração de um pastor. Por isso ele vence, e com isso ganha aliados.
Mas quando Deus se afasta, tal circunstância motiva sua lamentação, onde reconhece que não é
forte e nem corajoso sozinho:
Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Por que te alongas das palavras do meu bramido, e não me auxilias? Deus meu, eu clamo de dia, e tu não me ouves; de noite; e não tenho sossego ( vv.1-2 ).
O salmista se queixa da distância de Deus. O maior herói de Israel está sozinho. Ele não é mais
forte e nem corajoso, mas frágil e tímido, não é mais o rei, mas traz à Deus em oração o simples
pastor de ovelhas. Deixa transparecer do seu íntimo a crença de que Deus o abandonou. É
exatamente nesse tipo de situação, de fraqueza interior e dúvidas, o momento oportuno para o
surgimento de inimigos, que ele representa bem, utilizando-se de símbolos de animais reconhecidos por sua força ( o touro, o leão, o cão e o búfalo ). Ele se queixa de solidão espiritual e
da intensa perseguição dos seus inimigos. O salmista reconhece que sozinho ele não é um guerreiro, que é insiguinificante diante do poder de Deus e dos homens. Sabe que não pode vencer um ou outro. Ele não ousa lutar com Deus, mesmo por uma benção como fez Jacó, sabe que mesmo se a conseguisse, isso lhe trairia marcas dolorosas para o resto da vida. Ele não ousa lutar contra os seus perseguidores, porque acredita que sem Deus seus esforços seriam inúteis. Mesmo sofrendo, não chama Deus de injusto ou cruel, apenas insiste em conhecer os motivos pelos quais Deus lhe permite sofrer. Um pecado esquecido? Uma provação? Ele não sabe responder. O salmista questiona o tempo de Deus. O salmista julga que Deus demora, sinal de inquietação, de desespero, é por isso que ele clama intensamente. Exige urgência em sua causa, de uma solução rápida e eficiente de Deus sobre o seu problema. A exigência de velocidade nos empreendimentos humanos nos faz acreditar que podemos julgar os empreendimentos divinos com a mesma medida, o que é um erro.
Certa vez, assistindo ao filme O Exorcista: O Início, a doutora Sara em conversa com o cético ex
padre Maryn, ao comentar os abusos que sofreu durante a segunda guerra mundial pelos nazistas exclama em tom profético: É do inferno que temos a melhor visão de Deus. E a parábola do rico e do Lázaro é um exemplo disso: abrindo os seus olhos no Hades e de longe vendo Abraão e Lázaro, não se ouve de sua boca sequer um sussurro de blasfêmia contra Deus, pelo contrário, reconhece que está lá por consequência de sua vida, o que ele pede é misericórdia. É exatamente quando estamos embaixo que somente temos como alternativa olharmos para cima: Elevo os meus olhos para os montes: de onde me virá o socorro? O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra.
O salmista olha para o passado, como testemunho da ação de Deus na história do seu povo6.
Todo aquele que teme o futuro vê no passado uma forma segura para lamentar o presente7. O
salmista lamenta o seu presente. Como consequência, seu futuro fica sem perspectiva. Tendo a
sensação comum de passar anônimo no mundo, de não ter história, cujo espírito retraído e tímido
é idêntico a de muitos homens na contemporaneidade. Um grito de dor é dirigido a Deus. Há muitos gritos. Uma multidão clama por socorro! :
Todo aquele que teme o futuro vê no passado uma forma segura para lamentar o presente7. O
salmista lamenta o seu presente. Como consequência, seu futuro fica sem perspectiva. Tendo a
sensação comum de passar anônimo no mundo, de não ter história, cujo espírito retraído e tímido
é idêntico a de muitos homens na contemporaneidade. Um grito de dor é dirigido a Deus. Há muitos gritos. Uma multidão clama por socorro! :
Antes de prosseguir em meu caminho, e lançar o meu olhar para frente uma vez mais, elevo só, minhas mãos a ti na direção de quem eu fujo. A ti, das profundezas do meu coração, tenho dedicado altares festivos para que, em cada momento, tua voz me pudesse chamar. Sobre esses altares estão gravados em fogo estas palavras: Ao Deus desconhecido. Teu, sou eu, embora até o presente tenha me associado aos sacrílegos. Teu, sou eu, não obstante os laços que me puxam para o abismo. Mesmo querendo fugir, sinto-me forçado a servi-lo. Eu quero te conhecer, desconhecido. Tu que me penetras a alma, e qual turbilhão invades a minha vida. Tu, o incompreensível, mas meu semelhante. Quero te conhecer. Quero servir só a ti. ( Nietzsche ).
Fruto de um mundo sem Deus. Deus está morto? O homem está. A criatura sem o criador não
tem sentido, e sem sentido, o mundo passa a ser conduzido pela barbárie: A máquina expeliu o
maquinista; está correndo cegamente no espaço ( Horkheimer ). O mundo inteiro começa a ter a
sensação de que está morrendo. E Deus parece que não ouve, não fala, não vê. Sidney
Garambone, escritor brasileiro, em seu livro Eu, Deus, escreve: A ausência é a forma mais bela de presença. A ausência promove o grito de socorro do aflito que clama pela presença de Deus. Sem ausência não há grito de socorro, não há dependência da criatura pelo criador.
O salmista recorda da sua vocação, do seu chamado, e com isso reconhece o Senhor como o Deus
da sua vida. Do seu tempo, da sua história, dos seus projetos. Reconhece quem Deus é, e quem é
ele: Porém tu és santo.../ Mas eu sou verme, e não homem9. Isto significa que há um pacto, uma
aliança, que pela circunstância exige fidelidade, literalmente, que exige fé. Não se trata porém, de
se ter a mesma perspectiva de Deus, neste Salmo Davi reconhece que por não compreender os
motivos pelos quais Deus lhe permite sofrer, não consegue enxergar o mesmo que Deus. Se trata
porém de, mesmo quando não vemos o que Deus vê, deixar que ele nos guie pela mão e nos leve
onde deseja. Sinal do amparo divino diante da nossa cegueira espiritual. Embora não sabemos ao
certo por onde podemos caminhar ( como Abraão que sai sem rumo para uma terra que não
conhece e o povo hebreu no deserto ) ele vai adiante de nós. Entretanto, a grandeza de Deus não consiste em ressuscitar vivos, mas mortos. A grandeza de Deus consiste em agir apenas no fim das nossas possibilidades. Esse é o milagre. A grandeza de Deus consiste em deixar que tudo seja destruído, para que um novo céu e uma nova terra nasçam. Promessa apenas para os que crêem nele. Quando Deus permite o sofrimento do mundo e do homem, particularmente do justo, é porque ele quer construir um mundo e um homem novos:
Porque assim diz o Senhor: Como eu trouxe sobre este povo todo este grande mal, assim eu trarei sobre ele todo o bem que lhes tenho prometido.
No filme A Paixão de Cristo de Mel Gibson, uma cena em particular me levou intensamente às
lágrimas: o cansaço, aliado a intensa dor das feridas e as horas de caminhada fizeram a cruz um
peso difícil de carregar: Jesus cai no chão e Maria, sua mãe, vem ajudá-lo a se levantar. Olhando
para ela, com o rosto ensanguentado e ferido ele diz: - Veja mãe, eu faço novas todas as coisas. É
preciso passarmos pela cruz, e até morrermos nela, para dela ressuscitarmos. Novo. Glorificado. É o Cristo ressuscitado e glorificado quem diz: ... eis que faço novas todas as coisas...
No final de seu salmo, Davi canta em agradecimento pela salvação, que no meio de intensa dor,
talvez não é esperada mais. Davi agradece e seu agradecimento se torna um testemunho para os
homens de seu tempo, os povos ao redor e as gerações futuras do seu povo. Ele quer evidenciar
que a sua vida não está abandonada a própria sorte, de que existe a providência de Deus.
Providência significa estar sempre ao alcance do olhar, da misericórdia, da presença e da ação do
nosso criador. E para tanto é preciso reconhecermos nossa condição de criatura: nascidos de
Deus. Filhos dele. Sendo alvo da providência divina, toma consciência de que também precisa ser
dela um instrumento.
talvez não é esperada mais. Davi agradece e seu agradecimento se torna um testemunho para os
homens de seu tempo, os povos ao redor e as gerações futuras do seu povo. Ele quer evidenciar
que a sua vida não está abandonada a própria sorte, de que existe a providência de Deus.
Providência significa estar sempre ao alcance do olhar, da misericórdia, da presença e da ação do
nosso criador. E para tanto é preciso reconhecermos nossa condição de criatura: nascidos de
Deus. Filhos dele. Sendo alvo da providência divina, toma consciência de que também precisa ser
dela um instrumento.
Diante da perseguição e do silêncio de Deus o salmista, vendo que questionar o tempo oportuno
pela qual Deus decidirá agir é inútil, olha para o passado, e nele, encontra o sentido de sua
vocação, reconhecendo por isso a supremacia de Deus sobre a sua vida, mesmo diante da dor ( da
mesma maneira como Sadraque, Mesaque e Abed-nego estavam dispostos a morrerem por sua fé, sem esperarem com isso qualquer providência de Deus em auxílio por exemplo ). É exatamente essa confiança que garante o livramento inesperado. Deus nos chama hoje à firmeza de propósito, à maturidade espiritual. Deus nos chama para sermos fiéis. Sempre. Deus nos chama para dependermos mais dele e menos de nós próprios. Reis com corações de pastores.
Que Deus nos ajude nesse compromisso.
† Diogo Alves da Conceição Santana
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